Leia a íntegra da carta sobre a regulamentação do lobby escrita pelo Ethos e enviada ao Ministro Torquato Jardim, do Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle.

Na última sexta (30), o Instituto Ethos enviou ao Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle um ofício com propostas a serem apresentadas na audiência pública sobre a regulamentação do lobby no Brasil, que acontecerá nos dias 3 e 4 de outubro.

Esse documento representou a inscrição formal para que um representante do Instituto Ethos pudesse apresentar presencialmente suas propostas e argumentações.

O tema é acompanhado constantemente pelo Grupo de Trabalho do Pacto pela Integridade e contra a Corrupção. A atividade do lobby, se regulamentada, pode ser uma ferramenta importantíssima para complementar o marco regulatório de combate à corrupção, já que traz maior transparência às relações público-privadas.

Confira abaixo o documento.


Ofício Presidência Ethos nº 32/ 2016
Excelentíssimo Senhor Torquato Jardim
Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle

Assunto: Memorial de propostas para audiência pública sobre regulamentação da atividade de lobby no Brasil, a ser realizada nos dias 03 e 04 de outubro de 2016.

O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social desde sua fundação, em 1998, acompanha com grande interesse e participa ativamente das discussões referentes ao marco regulatório da prevenção e combate a corrupção no Brasil, com o intuito de aperfeiçoar a transparência e integridade das relações entre setor privado e público. Como parte de nossa missão, acreditamos que empresas podem – e devem – desempenhar um papel importante no combate à corrupção, atuando para promover um mercado mais íntegro e ético. Nesse sentido, em 2005 criamos o Pacto Empresarial pela Integridade e contra a Corrupção que congrega atualmente 322 signatárias e que define um conjunto de diretrizes e procedimentos que devem ser adotados pelas empresas no relacionamento com o poder público. O pacto foi desenvolvido em conjunto com diversos representantes do setor privado, entidades e organizações da sociedade civil e a partir das diretrizes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, do 10º princípio do Pacto Global e dos Princípios Empresariais da Transparência Internacional. Com o propósito de desenvolver estratégias para apoiar as empresas signatárias, criamos o Grupo de Trabalho do Pacto Empresarial pela Integridade e contra a Corrupção. Entre suas funções está a de auxiliar na implementação de políticas de promoção da integridade e combate à corrupção e mobilizar empresas e entidades empresariais.

É fundamental que essa mobilização em direção da transparência venha acompanhada de um aprofundamento de nosso marco legal, que reforce e corresponda a esses esforços e ratifique compromissos internacionais assumidos pelo país. Nesse sentido, a aprovação da Lei Federal 12.527/11 (Lei de Acesso à Informação), que regula o acesso à informação, e da Lei Federal 12.846/13 (Lei Anticorrupção) que entrou em vigor no dia 29 de janeiro de 2014, foram um importante avanço para mudar o cenário de combate à corrupção no Brasil e para que as empresas encontrem um ambiente mais favorável à ética nos negócios e com menores riscos, tanto aqui quanto no exterior. Além disso, esta última Lei representa o ajuste definitivo do Brasil em relação à Convenção da OCDE contra o Suborno de Funcionários Públicos em Transações Internacionais, à Convenção das Nações Unidas e à Convenção Interamericana de Combate à Corrupção (OEA) no concernente à responsabilização de pessoas jurídicas por atos de corrupção contra a Administração nacional e internacional.

Entendemos que a regulamentação da atividade do lobby será um importante mecanismo para aprimorar o marco regulatório de combate à corrupção, no sentido de promover maior transparência e integridade nas relações público-privadas. 

Assim, tendo em vista o relatório publicado em 22 de setembro de 2016 pelo Grupo de Trabalho do Ministério da Transparência sobre a regulamentação da atividade de lobby, descrevemos abaixo nossas sugestões e propostas de aspectos que devem ser considerados na elaboração da nova regulamentação.

1. Quanto à organização
a. Canais institucionais: entendemos que os canais devem ser estabelecidos e amplamente divulgados, bem como os procedimentos para acessá-los.
b. Deve haver tanto a identificação dos representantes de interesse quanto a capacitação do agente público para que a relação entre as partes seja definida e clara. Ainda quanto ao procedimento de capacitação, deve se estabelecer os requisitos mínimos para que o agente público faça parte de um dos canais institucionais estabelecidos.
c. Compreendemos que o princípio da transparência deve permear todas as etapas do processo.

2. Quanto ao credenciamento
a. O credenciamento é uma etapa fundamental no processo e é importante que seja bem descrito e não impeditivo, permanecendo disponível a qualquer cidadão.
b. Deve prever a possibilidade de credenciar pessoa física ou jurídica que tenha como atividade fim a defesa de interesses (que atue como representante). O objetivo da reunião ou representação deverá ser apresentado a cada nova solicitação de audiência.
c. Todos os registros de credenciamento e de solicitações de audiência devem estar disponíveis, incluindo a lista de credenciados, entidades e interesses a serem defendidos, audiências realizadas pelo representante.

3. Quanto à agenda dos agentes públicos
a. A agenda de todos os agentes públicos estabelecidos como canais institucionais deve ser acessível por qualquer cidadão e disponibilizar os encontros previstos e também o histórico dos encontros realizados.
b. Deve disponibilizar informações relevantes, constando no mínimo os participantes, pauta ou interesses a serem tratados.

4. Quanto ao recebimento de presentes ou benefícios por agentes públicos
a. As regras e limites devem ser claros e objetivos.
b. Deve ser estabelecido um procedimento de declaração dos presentes ou benefícios recebidos.

5. Considerações gerais
a. Reconhecemos que a elaboração de um regulamento aplicável ao Poder Executivo Federal é uma importante iniciativa. No entanto, a regulamentação da defesa de interesses é um tópico fundamental do marco regulatório anticorrupção, e, portanto, as discussões e iniciativas para uma regulamentação que seja perene e aplicável a todos os poderes de forma transversal devem permanecer. Sendo assim sugerimos que:
1. Seja incentivada a tramitação dos projetos de lei pertinentes e que a regulamentação ocorra no âmbito legislativo com aplicabilidade em todos os Poderes e em todas as esferas federativas, isto é, que recaia também sobre municípios e estados.
2. No âmbito do Poder Executivo Federal, também estejam contempladas:

– Administração direta e indireta (autarquias, fundações, etc.)
– Agências reguladoras
– Empresas públicas

b. Entendemos que o termo “lobby” deve ser substituído por expressões tais como: “representação de interesses” ou “defesa de interesses”. As expressões propostas no relatório (“relações governamentais” ou “representação social”) não traduzem a amplitude do tema.

Por fim, sugerimos que toda a regulamentação seja construída com base nos princípios de transparência e integridade, de forma que sempre se estabeleçam procedimentos para que as informações sejam acessíveis a qualquer tempo, por qualquer cidadão, sem que imponha qualquer tipo de restrição ou procedimento necessário para obtenção da informação.

Também é importante que as informações atendam aos princípios da Lei de Acesso à Informação, com disponibilização inclusive pela internet, em tempo real, formato aberto, de forma a incentivar todas as formas de controle social que contribuíam para a construção de uma sociedade mais íntegra, justa e sustável.

Diante do exposto acima, encaminhamos sugestões para que Vossa Excelência possa, no uso de suas atribuições, considerá-las para a elaboração de proposta de regulamentação da atividade de lobby.

Para fins da audiência pública a ser realizada nos dias 03 e 04 de outubro a representante do Instituto Ethos que irá realizar a exposição das propostas será Marina Martins Ferro, assessora executiva da Diretoria do Instituto Ethos.

 

Respeitosamente,
Jorge Abrahão
Diretor-presidente
Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social