No último ano, o Atlas da Mata Atlântica, publicado pela Fundação SOS Mata Atlântica e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais demonstrou queda de 9,3% do desmatamento do bioma Mata Atlântica entre outubro de 2017 e outubro de 2018 em comparação com o mesmo período entre os anos de 2016-2017. O relatório ainda destacava nove entre os 17 estados da Mata Atlântica, próximos ao nível do desmatamento zero e cinco estados em índices inaceitáveis de desmatamento, como Bahia, Minas Gerais, Paraná, Piauí e Santa Catarina.
Em dezembro de 2018, foi publicado na revista Nature Ecology & Evolution um artigo sob o título Strategic Approaches to Restoring Ecosystems can Triple Conservation Gains and Halve Costs, do economista Bernardo Strassburg. Neste artigo, além de destacar que há espaço suficiente e oportunidade na recuperação da Mata Atlântica em larga escala, apresenta-se uma metodologia para promover a recuperação de áreas agregadas ao invés de fragmentos isolados, modelo mais vigente, em propriedades rurais em todos os 17 estados.
A metodologia apresentada por Strassburg e sua equipe demonstra a possibilidade de se conciliar produtividade, reflorestamento barato, proteção da biodiversidade e sequestro de carbono da atmosfera. O estudo indica que agricultores podem fazer a recuperação devida, conforme previsto pela legislação, até fora de sua propriedade, por exemplo, em áreas de pecuária de baixa intensidade, possibilitando um novo tipo de planejamento ambiental. Com um algoritmo que divide a Mata Atlântica em 130 milhões de hectares em pequenos quadrados de 1km² e que resolve simultaneamente mais de 1 milhão de equações, viabiliza-se mapas capazes de indicar locais do bioma mais favoráveis para restauração e, consequentemente, para viabilização da regularização de propriedades.
A ciência, portanto, pode ser promotora de alternativas lucrativas para pequenas e grandes propriedades em áreas de alta ou baixa produtividade agropecuária, conciliando produção, extrativismo sustentável e floresta.
Os dois estudos acima mostram que tanto o controle social, o monitoramento, o combate ao desmatamento, como a pesquisa e o estímulo à ciência e à tecnologia, são fundamentais para gerar soluções para ampla proteção, recuperação e cumprimento da Lei da Mata Atlântica. Ou seja, para a manutenção da floresta em pé, consolidação da biomassa, da biodiversidade e de serviços ambientais. Mas, em 2020 com o despacho 4.410/2020, publicado no Diário Oficial da União em 06/04/2020, os órgãos vinculados ao Ministério do Meio Ambiente como o Ibama e o ICMBio devem reconhecer a aplicação do Código Florestal ao bioma Mata Atlântica.
Com o despacho também são reconhecidas as propriedades e respectivos empreendimentos instalados em áreas de proteção ambiental até julho de 2008, bem como possibilitados os cancelamentos de milhares de autos de infração por desmatamento e incêndio em Áreas de Preservação Permanente (APPs) do bioma. O despacho também nega vigência à Lei da Mata Atlântica e o regular exercício do poder de polícia em relação aos desmatamentos ilegais no bioma.
Com a MP 910, com o referido despacho e ainda com a normativa 9/2020, o Brasil se consolida como um país de pistoleiros e grileiros vorazes.
A Mata Atlântica tal como a Amazônia também é alvo de uma política que opera flexibilizações, suportadas por lobistas, que desrespeita a legislação ambiental, desestimula a preservação e a recuperação e implica em sérios prejuízos socioambientais.
Nessa toada, o Brasil, ao sair da pandemia, enfrentará além da retração da economia, o aprofundamento de sérias desigualdades, desmatamento e uma dificuldade profunda de convencer a comunidade internacional e investidores que segue uma trajetória amparada em modelos sustentáveis, inovadores e justos de desenvolvimento.
Por: Edson Lopes, gerente-executivo de Eventos do Instituto Ethos
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