Um estudo aprofundado sobre como o esporte se tornou um terreno fértil para a corrupção (e como podemos agir para mudar isso) foi lançado na última terça-feira (23) pela organização não governamental Transparência Internacional. No mesmo dia, foi divulgada uma nova pesquisa com torcedores pelo mundo que aponta a pouca confiança nos organismos internacionais de futebol, como a FIFA.
“O esporte deveria ser um vetor de coisas boas, no entanto, os últimos escândalos, não apenas no futebol mas também no atletismo e no tênis, mostram como esse ambiente é vulnerável à corrupção. Isso precisa acabar agora”, defendeu Cobus de Swardt, diretor administrativo da Transparência Internacional.
Confira o Relatório Global sobre Corrupção no Esporte, em inglês.
Para tentar encontrar um caminho de como seria possível combater a corrupção no meio esportivo, o relatório reúne diversos estudos que buscam as raízes desse problema. Os mais de 60 artigos foram escritos por acadêmicos, ativistas, atletas e ex-atletas, jornalistas e membros do Comitê Olímpico Internacional. Vários dos artigos tratam do Brasil, como poderia se imaginar, já que o país recebeu a Copa do Mundo, em 2014, e sediará a Olimpíada 2016 na metade deste ano. Dois deles tratam exclusivamente sobre a experiência brasileira na organização dos dois maiores eventos esportivos do mundo. O pesquisador da Universidade de Zurique Christopher Gaffney, autor do artigo “The Brazilian experience: Brazil as ‘role model’” (ou, numa tradução livre, “A experiência brasileira: o Brasil como ‘modelo’”), mostra como as dificuldades encontradas no planejamento e na execução da Copa do Mundo no nosso país poderão ser encontradas e enfrentadas pelos outros países-sede. Já o estudo “Rio 2016 and the birth of Brazilian transparency” (do inglês, “Rio 2016 e o nascimento da transparência brasileira”), escrito por uma equipe de pesquisadores da Universidade de Richmond, nos Estados Unidos, defende que as atuais mudanças na legislação brasileira, como a Lei Anticorrupção Empresarial e a Lei de Acesso à Informação, estão em consonância com um desejo manifesto pela população em ato públicos sobre a luta contra a corrupção.
O Brasil não foi o único objeto de análise. Dois jornalistas brasileiros também escreveram para a publicação. Juca Kfouri, da Folha de S.Paulo e do UOL, é o autor do artigo “Impunity and corruption in South American football governance” (do inglês, “Impunidade e corrupção na governança do futebol sul-americano”). Jamil Chade, correspondente do jornal O Estado de S.Paulo, contribuiu com o texto “Offside: FIFA, marketing companies and undue influence in football” (Ou “Fora do Jogo: FIFA, empresas de marketing e influência indevida no futebol”).
O Instituto Ethos também contribuiu para esse relatório, descrevendo a experiência do projeto Jogos Limpos dentro e fora dos Estádios. Entre outros assuntos, o texto comenta os avanços conquistados na transparência municipal e estadual com os Indicadores de Transparência e também com a criação dos acordos setoriais.
Recomendações da Transparência Internacional
No final do relatório, a Transparência Internacional lista seis medidas para combater a corrupção nos esportes:
1) Ampliar as ações de fiscalização independentes da governança internacional do esporte;
2) Criar critérios rigorosos e transparentes para o processo eleitoral dos cargos de direção das entidades esportivas e fazer uma verificação “ética” de todas as pessoas que venham a ocupar cargos de decisão;
3) Promover e tornar maior a transparência financeira em todas as entidades esportivas, relatando o quanto de dinheiro elas ganham e como ele é gasto, com detalhamento muito superior ao mínimo exigido pelas leis dos países em que estão instaladas;
4) Garantir a participação da sociedade civil nas licitações dos grandes eventos esportivos e a exigência formal de garantias para acabar com a corrupção e as violações dos direitos humanos, trabalhistas, sociais e ambientais;
5) Primar pela integridade e aplicar nas entidades esportivas os mesmos critérios éticos e legais utilizados nas cadeias de valor dos patrocinadores;
6) Estudar melhor a necessidade da criação de uma agência global anticorrupção específica para o esporte.
De acordo com a assessoria de imprensa da Transparência Internacional, esses critérios serão usados para avaliar os primeiros 100 dias de gestão do novo presidente da FIFA, Gianni Infantino, eleito nesta sexta-feira (26).
A confiança dos torcedores
A ONG divulgou no mesmo dia o resultado de uma pesquisa feita em conjunto com o Forza Football, um aplicativo de celular, sobre a confiança dos torcedores nas organizações do futebol. A grande maioria, 69%, não tem nenhuma confiança na FIFA, mas metade (50%) das pessoas que responderam acreditam que a entidade pode recuperar sua reputação.
Outro número importante é que 43% dos entrevistados dizem que os escândalos de corrupção afetam a maneira como eles torcem e assistem ao futebol. Participaram da enquete 25.000 pessoas de 28 países, entre os dias 8 e 17 de fevereiro.
Por Pedro Malavolta, coordenador de comunicação do Projeto Jogos Limpos, do Instituto Ethos.