A Operação Lava Jato, que, desde 2014, investiga políticos e empreiteiras envolvidos no escândalo de corrupção deflagrado na Petrobras, fez com que o financiamento de campanha fosse o foco do olhar público, como uma brecha para atos ilícitos e crimes de ordem econômica. Casos desse tipo, em que fraude e lavagem de dinheiro contaminam a relação entre o público e o privado, na maioria das vezes estão associados às doações para campanhas eleitorais.

As empreiteiras investigadas na operação Lava Jato da Polícia Federal doaram quase R$ 98,8 milhões aos dois principais candidatos à presidência, Dilma Rousseff e Aécio Neves, que chegaram ao segundo turno das eleições de 2014. Uma prestação de contas apresentada ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que as empreiteiras da Lava Jato doaram R$ 438,3 milhões para partidos em 2014. O PT foi o que mais angariou receitas: R$ 147,9 milhões. Em segundo lugar está o PSDB, com R$ 82,3 milhões e, em seguida, o PMDB, com R$ 76,5 milhões. Os três partidos que mais receberam foram os que mais tiveram governadores eleitos na última eleição: foram 17, sendo sete do PMDB, cinco do PT e cinco do PSDB.

Empreiteiras da Lava Jato doaram R$ 98,8 mi a campanhas de Dilma e Aécio
Quanto cada partido recebeu das empreiteiras da Lava Jato

O financiamento político está intimamente ligado a isso, uma vez que as contribuições a campanhas eleitorais e partidos políticos têm duas faces. Por um lado, ajudam a fortalecer de organizações partidárias e a comunicação entre candidatos e eleitores, possibilitando, portanto, uma competição política ativa e saudável. Por outro, podem distorcer o processo eleitoral e também prejudicar a integridade dos futuros representantes políticos.

Há foco excessivo, portanto, nos candidatos e pouco aprofundamento no debate político e em propostas de governo. Entretanto, restringir o financiamento de campanhas deve se alinhar em grande parte a uma legislação mais consistente nessa agenda e a práticas governamentais mais transparentes. Nos Estados Unidos, por exemplo, as doações diretas são proibidas, mas é lícito escolher um ou outro candidato para apoiar publicamente e fazer campanha informalmente. Isso faz com que, na prática, o controle não seja efetivo. No Canadá, entre 80% a 90% do financiamento total de campanhas é público. Na Colômbia, desde 2005, a lei estabelece que 80% das eleições presidenciais devem ser financiadas com recursos públicos.

O financiamento das campanhas até 2014
O Brasil tinha um sistema de financiamento misto de campanhas eleitorais, isto é, recursos públicos e privados iam para os partidos de modo que pudessem cobrir as despesas com funcionários, peças de marketing, jingles, eventos e comícios.

Em 1995, criou-se o Fundo Partidário. A reserva retinha o dinheiro do contribuinte e de multas aplicadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para serem gastos com a campanhas. No Brasil, 1% dos recursos do Fundo Partidário é distribuído para todos os partidos, 19% são divididos igualmente entre aqueles representados no Congresso e 80% são repassados a cada um de forma proporcional ao total de votos obtidos na última eleição para a Câmara dos Deputados.

Nas eleições de 2014, o Fundo Partidário repassou R$ 313.494.822, sendo que aproximadamente 38% desse total foram destinados ao PMDB, PSDB e PT. Ao mesmo tempo, no âmbito privado, as doações chegaram a R$ 5 bilhões, o que equivale a 95% do custo total das eleições. O que mais chama a atenção é que as doações são oriundas de apenas 0,4% do total de empresas cadastradas no país. São poucos que pagam muito.

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Distribuição do Fundo Partidário em 2014

Enquanto em 2002 o total líquido de doações era de R$ 792,5 milhões de reais, em 2014 o valor chegou a R$ 5 bilhões. Ou seja, além de haver uma relação diretamente proporcional entre a candidatura e o dinheiro doado, é possível observar que o financiamento aumentou estrondosamente nos últimos 12 anos. De acordo com o site Às Claras, o custo do voto na eleição presidencial e estadual de 2014, foi de R$ 7,90, seis vezes maior do que em 2002. Nas municipais de 2012, foi de R$ 20,61, três vezes maior do que em 2004.

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As vantagens do novo modelo
O antigo financiamento misto fazia com que o Congresso Nacional fosse bastante impactado pelas doações e pelos interesses dos beneficiários. Recentemente, Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras que está sendo investigado pela Lava Jato, afirmou que doações legais não existiam no Brasil: na verdade, eram “empréstimos a serem cobrados posteriormente a juros altos dos beneficiários das contribuições quando no exercício dos cargos”. Com o financiamento privado, os candidatos e partidos não disputam a eleição em pé de igualdade. Quem representar interesses econômicos poderosos terá acesso a mais recursos do que os concorrentes que representarem grupos desfavorecidos.

Sendo assim, a expectativa é que haja redução da influência do poder econômico sobre o processo eleitoral, o que proporcionará mais debates em torno de ideias e propostas para benefício da sociedade como um todo. Isso poderá reaproximar políticos e sociedade civil, restaurando aos poucos uma relação desgastada.

As empresas, por sua vez, deverão continuar exercendo seu papel de promover e participar dos debates e permanecerão em uma posição importante, de agente de mobilização social. Além disso, elas poderão contribuir para exigir de candidatos compromissos públicos com suas promessas de campanha, ao demandar que sejam concretas, claramente descritas e com metas quantificadas e, finalmente, ao cobrar dos candidatos eleitos seu efetivo cumprimento.

 

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Foto: Elza Fiúza/ABr