Desde 2004, o Instituto Ethos pede uma legislação como essa e participou ativamente na mobilização de empresas em favor da aprovação dessa lei.

O PL 6826, que foi aprovado por unanimidade pela Câmara dos Deputados em abril último, foi enviado ao Senado como PLC 39/2013. Em junho, com a força das ruas, esse projeto de lei foi votado nessa casa e aprovado, no início de julho, também por unanimidade. Agora só falta a sanção da Presidência da República para entrar em vigor.

A aprovação da Lei de Responsabilização Civil e Administrativa da Pessoa Jurídica é um grande passo para o desenvolvimento da responsabilidade social nas empresas. A punição deixa de atingir apenas o funcionário que tenha cometido algum delito e alcança a própria empresa. Melhor: as empresas que implantam de prevenção da corrupção e de compliance com a legislação passam a ter atenuantes legais no caso de serem arroladas em malfeitos que não tenham conseguido evitar.

Por que essa lei é tão importante?

Além de drenar os recursos da sociedade que deveriam ir para saúde, educação, segurança e infraestrutura, a corrupção também é um grande obstáculo ao desenvolvimento econômico e sustentável do país. Por isso, a lei anticorrupção é fundamental.

As empresas sérias, que trabalham dentro da lei e buscam a competição leal e transparente por melhores posições no mercado, têm na corrupção uma inimiga dos negócios. A corrupção mina essa competição leal e, pior, quando não é punida, dissemina por toda a sociedade a ideia de que melhor é não ter ética.

A corrupção torna empresas ineficientes em empresas mais competitivas do que aquelas que investem em inovação e em boa governança. Portanto, a corrupção acaba desestimulando o próprio investimento.

A corrupção muda as referências. Quem tem ética passa a ser considerado um perdedor, um bobo, um ingênuo, um idealista. Ganha quem sabe “tirar vantagem em tudo”.

Onde não há ética não há direitos garantidos, nem trabalhistas, nem civis. Por isso, combater a corrupção deve ser uma iniciativa de toda a sociedade.

Assim, desde 2004, o Instituto Ethos pede uma legislação como essa e participou ativamente na mobilização de empresas em favor da aprovação dessa lei. Já nas primeiras reuniões do Conselho Nacional de Transparência Pública e Combate à Corrupção, naquele ano, o Instituto Ethos apresentou proposta de criação de um cadastro de empresas envolvidas em corrupção, para que elas não tivessem acesso a recursos públicos, como já ocorria com aquelas condenadas por trabalho análogo à escravidão. Essa lista também ajudaria a identificar as práticas comuns de corrupção e a adotar medidas preventivas.

Essa proposta não evoluiu. Por isso, em 2005, o Instituto Ethos e a consultoria Patri Políticas Públicas organizaram, em parceria com o jornal Valor Econômico, dois seminários, um em São Paulo e outro no Rio de Janeiro, sobre o que as empresas podem fazer para enfrentar a corrupção.

Em 2006, como forma de reagir às denúncias de empresas que participavam do que se convencionou chamar de “mensalão”, o Ethos e várias organizações criaram o Pacto Empresarial pela Integridade e contra a Corrupção, um compromisso voluntário que as signatárias assumem para aprofundar a ética e a transparência nas relações entre si, com o mercado e com o setor público. As organizações que ajudaram a articular esse pacto, juntamente com o Instituto Ethos, foram o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC); o Comitê Brasileiro do Pacto Global da ONU, a Patri Políticas Públicas, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e o Fórum Econômico Mundial.

Em 2007, as mesmas entidades criaram o GT Empresas pela Integridade, para apoiar as signatárias em suas ações anticorrupção e propor políticas públicas de promoção da integridade e da transparência. O GT foi criado depois de um debate realizado na Conferência Ethos daquele ano, que contou com a presença do ministro Jorge Hage, da Controladoria-Geral da União (CGU).

Em 2008, as empresas participantes da Conferência Ethos daquele ano propuseram a criação de um marco legal de responsabilização criminal e civil da pessoa jurídica. Essa proposta foi levada pelos representantes do Ethos ao Conselho Nacional da Transparência Pública e Combate à Corrupção e consta da ata daquela reunião do órgão.

Em 2009, o Instituto Ethos propôs à Siemens o projeto Jogos Limpos Dentro e Fora dos Estádios, que visa ampliar a consciência, a organização e o controle social sobre os orçamentos públicos a partir da mobilização para os megaeventos esportivos que vão se realizar no Brasil: a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016.

No início de 2010, a CGU e o Ministério da Justiça, com a contribuição da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Casa Civil da Presidência da República, encaminharam ao Legislativo o projeto de lei sobre criminalização da pessoa jurídica por atos contra a Administração Pública, o PL 6826.

Ainda em 2010, foi sancionada a Lei da Ficha Limpa, depois de ampla mobilização popular, e também a Lei de Acesso à Informação (LAI).

Em 2011, as empresas signatárias do Pacto Empresarial pela Integridade e contra a Corrupção lançaram um manifesto público pela imediata aprovação do PL 6826 e iniciaram campanha on-line para angariar adesões.

Em 2012, uma comitiva formada por representantes de entidades engajadas na luta anticorrupção, inclusive o Instituto Ethos, entregam o manifesto público ao então presidente da Câmara Federal, Marco Maia.

Agora, finalmente, o projeto está em vias de entrar em vigor, bastando, para isso, a sanção presidencial.

Queremos aproveitar aqui a oportunidade para cumprimentar a CGU por iniciativas como a dessa lei e também da Lei de Acesso à Informação que vão tornando o país mais democrático e justo.

É bem verdade que o PL teve o trâmite demorado e foi modificado por pressão de parte do setor empresarial. Mas é importante ressaltar que outra parte – significativa – desse mesmo empresariado propôs e vem apoiando a punição da pessoa jurídica desde o início, porque ela é benéfica ao próprio desenvolvimento dos negócios.

A lei anticorrupção torna obrigatórios alguns dos compromissos que as empresas signatárias já assumiram voluntariamente no Pacto Empresarial pela Integridade e contra a Corrupção.

A lei também pode abrir espaço para autorregulação, com as empresas tornando válido o que ficou de fora do projeto que foi ao Senado. Um desses itens é a proibição de empresas condenadas por corrupção obterem empréstimos em bancos públicos. Isso foi retirado, mas o projeto manteve o chamado “cadastro sujo”, de empresas condenadas por atos ilícitos contra a administração pública. Assim sendo, empresas e bancos públicos podem assumir o compromisso voluntário de não negociar com aquelas que estiverem listadas nesse cadastro, como já se faz em relação ao trabalho análogo à escravidão.

Instituto Ethos