Pesquisa revela o nível de confiança das sociedades de 26 países, entre os quais o Brasil, em quatro segmentos: empresas, governo, ONGs e mídia.
Por Paulo Itacarambi*
A Edelman, uma das maiores agências de comunicação e de relações públicas do mundo, realiza, desde 2001, uma pesquisa denominada Trust Barometer – Estudo de Confiança Edelman, sobre confiança e credibilidade nas instituições de quatro segmentos: empresas, governo, ONGs e mídia. Uma vez por ano, a Edelman conversa on-line, por 20 minutos, com 26 mil pessoas de todas as classes e idades, em 26 países; também entrevista 5.800 pessoas formadoras de opinião nesses mesmos países. Os resultados apurados nesses dois públicos foram apresentados em separado na pesquisa. Mas é interessante notar que são coincidentes na maioria dos tópicos estudados.
A principal conclusão do Barômetro da Confiança de 2013 é que há uma crise de confiança e de credibilidade nas lideranças atuais de governos e empresas. Menos de uma pessoa em cada cinco acredita que um líder fala a verdade numa crise ou num assunto difícil. Também há um fosso entre as instituições e seus respectivos líderes. Por exemplo: a confiança nas empresas é maior do que a confiança nos empresários em 32 pontos; e, nos governos, 28 pontos maior do que nos governantes.
Uma das explicações é que em 2012 ampliou-se a tendência de democratização da influência: os públicos interessados cada vez mais confiam em “pessoas comuns”, como empregados, funcionários públicos, bem como em especialistas e acadêmicos. De acordo com a Edelman, essas pessoas desfrutam do dobro da confiança de um CEO ou de um ministro ou funcionário de alto escalão de um Estado. Isso demonstra que as pessoas acreditam mais em quem não tem interesse político ou financeiro envolvido.
Como o resultado afeta as instituições?
A confiança em alguém ou em uma organização resulta da combinação de três grandes fatores interdependentes:
- Competência, isto é, a capacidade de fazer bem feito aquilo que a pessoa diz que sabe fazer. Se alguém se propõe a executar uma tarefa e depois não a faz bem, perde confiança;
- Sinceridade, ou seja, a pessoa diz o que de fato está pensando e faz o que diz. Em outras palavras, a confiança depende de haver integridade entre o que pensamos, o que falamos e o que fazemos;
- Responsabilidade, entendida como o comportamento de entregar o que foi prometido, dentro do prazo previsto, e arcar com as consequências das próprias ações.
Tais características compõem o conjunto de valores intangíveis que formam a reputação de um negócio e constituem a base central dos fundamentos da responsabilidade social empresarial e da sustentabilidade. Hoje, 80% do valor de mercado de um negócio são constituídos pelos intangíveis. Portanto, administrar valores intangíveis – e a confiança está entre eles – é estratégico para as instituições.
Para conquistar a confiança e a credibilidade das pessoas e da sociedade, o negócio deve ir além de pagar bons dividendos aos acionistas; ele precisa gerar valor para todas as partes interessadas, atuando como força de desenvolvimento da sociedade.
Principais dados da pesquisa
Na pesquisa global, desde 2007 as ONGs são consideradas as entidades mais confiáveis, com índices sempre crescentes. As empresas vêm em segundo lugar, a mídia em terceiro e o governo em último lugar.
No Brasil, a mídia foi considerada a instituição mais confiável em 2013. Entre 2007 e 2012, o primeiro lugar foi das empresas. Elas estão em segundo lugar, no levantamento deste ano. Em terceiro vêm as ONGs e, em último, o governo. Essa classificação foi dada tanto pelo público em geral quanto pelos formadores de opinião.
Motivos para a falta de confiança nas empresas e no governo
Corrupção, falta de transparência e incompetência foram os motivos alegados pelos participantes da pesquisa para explicar a queda de confiança nas instituições.
Em relação ao resto dos países, o Brasil é o que apresenta maior confiança na mídia. Ela é considerada mais confiável do que empresas, governos e ONGs. Mas, comparada a outros dez importantes segmentos econômicos do país, ela ocupa o sétimo lugar. Tecnologia é o setor mais confiável do Brasil, segundo a pesquisa, com 80% da preferência dos entrevistados. Em seguida vêm os alimentos, produtos farmacêuticos, energia, setor automotivo, bens de consumo não duráveis, mídia, bebidas, telecomunicações, bancos e serviços financeiros.
Por que não é alta a confiança nas ONGs no Brasil?
Há quatro motivos que explicam essa situação:
1 – O uso indevido de algumas ONGs para desviar recursos públicos gerou um debate público que generalizou o problema para todas as outras. Os casos de empresas e municípios, por exemplo, não são tratados dessa forma.
O próprio governo federal ajudou a disseminar esse tratamento público, ao nivelar as ONGs por baixo, suspendendo os contratos e os repasses para todas elas, sem a devida diferenciação e sem reconhecer o valor histórico e a importância do terceiro setor para o país.
2 – Insegurança jurídica, porque não há leis específicas para regular as relações das ONGs com os governos e com o setor privado. Sem esse marco regulatório, os contratos com os governos são celebrados por meio de instrumentos inadequados, que abrem brechas para os malfeitos. Aliás, os próprios servidores têm receio de contratar ONGs, porque, no final, eles acabam sendo responsabilizados pessoalmente por eventuais irregularidades.
3 – Falta de financiamento adequado, fazendo com quem o trabalho não seja identificado com quem o realiza, mas com o patrocinador, público ou privado. Ou seja, as ONGs fazem o trabalho, mas quem leva o mérito é quem as financia. Com isso, a sociedade não percebe o grande trabalho que essas organizações vêm fazendo.
4 – Falta de cultura de doação e de prestação de contas. As ONGs valorizam mais o seu próprio trabalho do que o esclarecimento para a sociedade do que fazem.
Necessitamos de um marco regulatório que discipline os contratos entre ONGs e Estado e entre ONGs e a iniciativa privada, que incentive o financiamento e que reconheça o valor para a sociedade das organizações da sociedade civil.
Precisamos, também, desenvolver uma cultura de prestação de contas e uma cultura de doação que seja sustentada por mecanismos e incentivos e por uma regulamentação adequada, que dê segurança tanto para quem financia como para quem vai usar o dinheiro. Isso certamente contribuirá para que a confiança da sociedade nas instituições aumente.
* Paulo Itacarambi é vice-presidente executivo do Instituto Ethos.