Resolução vai ajudar a mensurar os impactos socioambientais dos produtos e serviços ofertados e sua adequação às demandas dos clientes e usuários.
Por Paulo Itacarambi, vice-presidente do Instituto Ethos
Duas novas resoluções do Banco Central do Brasil estão em audiência pública desde 18 de junho passado: uma que dispõe sobre a responsabilidade socioambiental das instituições financeiras e outra que descreve como deve ser a elaboração e a divulgação do relatório de responsabilidade socioambiental. Por meio delas, o órgão quer garantir que as instituições reguladas por ele – bancos, financeiras, consórcios e cooperativas de crédito – regulamentem suas políticas socioambientais e as informem ao público.
Como responsável pela garantia do poder de compra da moeda nacional e pela estabilidade do sistema financeiro do país, o BC, entre outras atribuições, dá autorização de funcionamento para as instituições financeiras ou de crédito. No Brasil, são 2.504 entidades que atuam no mercado de capitais ou de crédito, assim divididas: 357 conglomerados financeiros; 160 bancos comerciais, múltiplos e a Caixa Econômica Federal; 1.321 cooperativas de crédito e sociedades de crédito ao microempreendedor; 405 bancos de investimento, de desenvolvimento, sociedades corretoras, sociedades distribuidoras, sociedades de crédito, financiamento e investimento, de crédito imobiliário, de arrendamento mercantil, de investimento, agências de fomento e companhias hipotecárias; e 261 administradoras de consórcios.
São conhecidas as diretrizes voluntárias que algumas instituições do setor adotam no sentido de incorporar as questões socioambientais aos seus diferentes segmentos de negócios. Entre essas diretrizes há, em âmbito internacional:
– os Princípios do Equador (Equador Principles), para a atividade de financiamento de projetos;
– os Princípios para o Investimento Responsável (Principles for Responsible Investment – PRI), para a gestão de recursos e fundos de investimentos; e
– os recém-lançados Princípios para Sustentabilidade nos Seguros (PSI – Principles for Sustainable Insurance), para análise de riscos do segmento de seguros.
Em âmbito nacional, existem o Protocolo Verde dos bancos públicos e o Protocolo Verde da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), cujas diretrizes abrangem diferentes segmentos de negócios.
O Protocolo Verde dos bancos públicos é um documento firmado entre estas instituições e o Ministério do Meio Ambiente, no qual Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, BNDES, Banco da Amazônia e Banco do Nordeste se comprometem voluntariamente a usar critérios de sustentabilidade na análise de concessão de créditos.
O Protocolo Verde da Febraban vai no mesmo sentido. Trata-se de protocolo de intenções assinado voluntariamente pela entidade e pelos bancos privados com o Ministério do Meio Ambiente, no qual há o compromisso de oferecer linhas de financiamento que fomentem a qualidade de vida da população e o uso sustentável do meio ambiente, considerando-se os impactos e custos socioambientais na gestão de seus ativos e na análise de risco de projetos, e a promover interna e externamente o consumo consciente dos recursos naturais.
Esses avanços regulatórios e as iniciativas das próprias instituições financeiras, inclusive por meio da autorregulação, têm conferido ao Sistema Financeiro Nacional destaque internacional em responsabilidade socioambiental.
O BC, por sua vez, vem há tempos se dedicando ao estudo de temas que dizem respeito à relação entre o sistema financeiro e questões socioambientais e participando das discussões para a construção de um ambiente institucional e regulatório propício à disseminação das melhores práticas de sustentabilidade nos negócios financeiros e na economia.
Em dezembro do ano passado, o BC e o Uniethos promoveram um seminário no qual foi apresentado o resultado de uma pesquisa sobre a situação da sustentabilidade no sistema financeiro nacional. Vale a pena recordar alguns dados: 32% dos bancos que operam no Brasil são signatários de pelo menos um padrão de sustentabilidade; 15% das instituições financeiras possuem políticas de sustentabilidade; 10% delas fazem relatórios.
Proposta de regulação
Essa pesquisa do Uniethos demonstrou que apenas uma pequena parcela do universo financeiro do país já está preparada para cumprir as novas normas. Com o objetivo de chegar a 100% dessas instituições, o Banco Central decidiu ampliar a regulação sobre as práticas de responsabilidade socioambiental. Por meio de uma resolução que está em audiência pública, as instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central devem estabelecer e programar políticas de responsabilidade socioambiental.
De acordo com essa resolução, tais políticas devem, entre outras obrigações, contemplar:
– os impactos socioambientais de serviços e produtos financeiros;
– os riscos e oportunidades em relação às mudanças climáticas e à biodiversidade;
– o gerenciamento do risco socioambiental; e
– a governança das políticas socioambientais nas instituições.
Além disso, a política de responsabilidade socioambiental deve considerar a avaliação das operações, segundo o risco socioambiental, com base em critérios consistentes e passíveis de verificação, tais como a qualidade da gestão socioambiental do cliente, a qualidade das garantias das operações em relação aos aspectos socioambientais (imóveis em áreas contaminadas ou com passivos ambientais, por exemplo) e a utilização de instrumentos que proporcionem efetiva mitigação do risco socioambiental (como o seguro ambiental).
A outra resolução (que também está em audiência pública) obriga as instituições financeiras de capital aberto ou com dever de constituir comitê de auditoria a elaborar e divulgar anualmente o seu relatório de responsabilidade socioambiental, a partir da data-base de 31 de dezembro de 2013.
Qual a importância dessas regulações?
A primeira resolução, que estabelece os critérios para a política socioambiental de uma instituição financeira, vai ajudar a mensurar os impactos socioambientais dos produtos e serviços ofertados e sua adequação às demandas dos clientes e usuários, bem como o gerenciamento e a governança do risco socioambiental. O estabelecimento dessa política também funcionará como um incentivo adicional para aumento de eficiência, diminuição de custos e ganhos de produtividade.
A segunda resolução visa estabelecer a obrigatoriedade de divulgação anual, pelas instituições financeiras, de relatório contendo as informações sobre práticas adotadas no âmbito da política de responsabilidade socioambiental da instituição. Esse relatório deverá ser elaborado em conformidade com as melhores práticas internacionais, de modo a evidenciar para a sociedade, de forma clara, a relação da instituição com suas partes interessadas.
Essas regulações representam avanços importantes, mas podemos esperar dificuldades para que elas sejam colocadas em prática, pois a maioria das instituições não está preparada para cumpri-las. No que diz respeito à publicação dos relatórios, torná-la obrigatória é muito importante, porque faz com que as instituições se tornem mais transparentes. Mas, a qualidade desses relatórios precisa melhorar muito. Por exemplo, não vemos neles informações sobre o volume de financiamento que é avaliado pelos critérios de risco socioambiental.
As instituições financeiras e os cidadãos que desejarem contribuir com esse processo podem registrar suas sugestões até 11 de setembro de 2012, no site do Banco Central: www.bcb.gov.br.
18/7/2012