A sigla do momento, ESG, realmente veio para ficar
A tendência da sustentabilidade não é nova, mas com a pandemia – que escancarou as profundas desigualdades sociais no Brasil e colocou o país novamente no Mapa da Fome -, os pilares Environmental, Social and Governance (do inglês, Meio Ambiente, Social e Governança), ganharam ainda mais força.
Os critérios ESG têm guiado investidores, mas também empresas e instituições que querem observar os efeitos, tanto positivos como negativos, que produzem na sociedade e, assim, repensar ações e promover iniciativas mais responsáveis com seus colaboradores, beneficiários, a sociedade e o planeta.
Nesse sentido, é imprescindível que processos de monitoramento e a avaliação também sejam uma prática para ações ESG. E é esse o tema, inclusive, da nova Nota Técnica Mensuração de Resultados e Impactos ESG, elaborada pela Agenda de Avaliação do GIFE.
O material reforça que, apesar de não ser recente, o assunto ainda é considerado novidade para a maioria das empresas no Brasil, que têm enfrentado dificuldades para avaliar as práticas de sustentabilidade.
Para Luana Maia, diretora de operações e planejamento estratégico do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), são inúmeros os desafios quando o assunto é articulação entre monitoramento, avaliação e aprendizagem com a temática ESG. Um deles é o de construir um engajamento coletivo, sistêmico e genuíno com os aspectos ambientais, sociais e de governança.
“Embora a liderança da empresa tenha um papel essencial no compromisso com a sustentabilidade do negócio, isso realmente só vai acontecer se todas as áreas estiverem comprometidas”, explica, pontuando a importância da empresa envolver seus colaboradores no tema.
Múltiplos referenciais
A busca por referências qualificadas para a realização de processos avaliativos de ações ESG também pode representar um desafio, não pela falta de material, e sim pela quantidade.
A diretora do CEBDS destaca que atualmente há um volume considerável de referenciais de indicadores e boas práticas para definir metas de desenho em ESG, com muitos conceitos, metodologias, frameworks e indicadores, fazendo com que seja difícil encontrar os melhores critérios de monitoramento e medição. “Nesse caso, é necessário fazer ajustes constantes e garantir que todos os envolvidos tenham compreensão desse processo”, afirma Luana.
A nota técnica, por sua vez, aponta que os ratings [classificação, em tradução livre] de agências, atualmente muito usados pelas empresas, não contam com métricas comuns entre si – o que pode gerar diferenças na conclusão da avaliação a depender do critério adotado. Estar alinhado ao rating não significa, entretanto, que a empresa gera impacto positivo.
“Muitas métricas de ESG já capturam insumos de forma eficaz, mas elas presumem causalidade – que adicionar mulheres às equipes de alta gerência, por exemplo, produzirá melhores resultados. Mas medidas que capturam inputs (número de mulheres nessas equipes, por exemplo) não capturam outcomes (a tomada de decisão como reflexo de diversas perspectivas) e tampouco capturam os impactos (valor social criado por tais decisões)” (HOWARDGRENVILLE, 2021, s. p.)”, exemplifica trecho do documento.
As diferentes direções de práticas ESG
As práticas ESG podem acontecer em algumas direções: medidas para dentro da organização; para fora da organização, visando minimizar efeitos negativos e potencializar efeitos positivos do negócio; e para fora da organização na forma de investimentos externos.
Entretanto, para Luana, independente da direção escolhida, antes de mais nada é importante entender a natureza dos impactos do negócio, mapear as partes interessadas e conversar com elas sobre os impactos. “Somente ao compreender de que forma e com que intensidade a empresa influencia, positiva ou negativamente, as suas partes interessadas, é possível definir por onde começar e, normalmente, isso vai significar medidas internas, externas e investimento dentro de um mesmo período.”
Um exemplo de ação interna são as contratações e ações afirmativas. Já com foco externo, a Nota técnica cita a criação de empregos e melhoria da infraestrutura de logística em uma determinada comunidade, ou seja, medidas que buscam minimizar os efeitos negativos e potencializar os positivos gerados pelo negócio. O terceiro nível representa a realização de investimentos de forma planejada, monitorada e sistemática em iniciativas voltadas para promover resultados sustentáveis e transformação socioambiental, o que equivale ao investimento social privado.
Como avaliar?
Por mais que a existência de múltiplos referenciais e critérios de avaliação de práticas e iniciativas ESG possa gerar certo grau de incerteza nas empresas, além de resultados potencialmente diferentes, o caminho para a realização de uma avaliação ESG é, em linhas gerais, muito semelhante a processos adotados em outras esferas. São quatro passos no total. O primeiro deles consiste em definir qual a mudança desejada e, a partir dessa clareza, traçar quais ações serão necessárias para alcançar esse objetivo.
Ter essa visão de transformação clara e as ações para promovê-la vai ajudar no segundo passo da avaliação, que é o acompanhamento da implementação do programa, projeto ou iniciativa. Nesta etapa, ter um esboço dos resultados pretendidos também pode ajudar a empresa a avaliar se está caminhando na direção certa.
O terceiro passo é a avaliação em si, e, a depender dos objetivos e propósitos da iniciativa em questão, cada empresa poderá adotar abordagens diferentes de processos avaliativos. Se alguns buscam responder sobre o retorno gerado por um investimento, outros prezam por analisar os efeitos das intervenções e os impactos causados.
Uma observação relevante ao debate sobre avaliação de ações ESG é o tempo. Algumas ações dos pilares social e ambiental, por exemplo, podem ser de maior prazo, isto é, demandar mais tempo para que os resultados sejam notados. Luana explica que por mais que as práticas ESG sejam um processo, algumas mudanças serão imediatas, enquanto outras terão prazos maiores, como é o caso da educação, área na qual as ações devem ser pensadas na ordem de décadas. Por outro lado, a diretora cita questões relacionadas à saúde e segurança dos trabalhadores ou de clientes, cujos resultados precisam ser de curto prazo.
“Alguns pontos se tornam mais eficazes com mais tempo de execução, mas tudo é uma construção. Por isso, é importante ter aliados internos e externos, trocar experiências com outras empresas, participar de conselhos, usar pesquisas e conhecer boas práticas. Assim é possível evitar erros”, afirma.
Nesse sentido, o quarto passo do processo avaliativo consiste em comunicar resultados para diferentes públicos interessados – como colaboradores da organização, financiadores, comunidade onde a empresa opera ou público beneficiário dos investimentos socioambientais – e criar espaço para que as equipes e os gestores possam aprender com eles.
No contexto do boom do ESG e a decorrente desconfiança de investidores e stakeholders em torno de práticas de greenwashing e socialwashing, isto é, ações pouco ou nada efetivas usadas com fins de marketing, a comunicação e a transparência constituem instrumentos importantes para o aprimoramento das iniciativas, o fortalecimento da imagem da empresa e suas relações internas e externas.
“A preocupação com a reputação da empresa é uma poderosa ferramenta de sensibilização para aqueles que ainda não têm uma maior vivência nas questões ESG. No entanto, limitar-se a ela pode inibir a capacidade de se aperfeiçoar, de aprender. O esforço das empresas em comunicar seus resultados ESG deve ser pautado por esse equilíbrio entre as conquistas e os pontos ainda a aperfeiçoar. Essa transparência indica maturidade da gestão e que os riscos estão sendo mapeados e endereçados. Afinal, é difícil acreditar que tudo está indo sempre bem em um negócio”, completa Luana.
Leia a Nota Técnica
Elaborada pela Agenda de Avaliação do GIFE, a Nota Técnica Mensuração de Resultados e Impactos ESG está disponível na Sinapse.