Instituto escreve nota de repúdio
Enquanto o Brasil tenta achatar a curva da Covid-19 e conter a pandemia por meio do isolamento social promovido pelos governos estaduais e municipais e pelo Ministério da Saúde, como forma de profilaxia mais segura e eficiente, as manifestações antidemocráticas do presidente Jair Bolsonaro e apoiadores enfraquecem não só a capacidade de imunidade do país, mas também a proteção da Constituição Federal.
Thomas Jefferson alertava acerca da democracia, dizendo que o preço que a liberdade cobra é a eterna vigilância. A cultura e a prática democrática exigem uma atitude e uma intervenção na realidade e, portanto, para as democracias não cabe a acomodação ou o abandono.
Golpes têm poucas chances de sucesso quando cidadãos e cidadãs têm forte apego pela democracia e pela liberdade e se levantam em sua defesa. Golpes e golpistas clássicos, ou deixam claro que a democracia não está mais em vigor ou fazem de conta que a democracia permanece intacta, mantendo a aparência. O Brasil já conheceu essas diferentes versões em sua história recente, mas tal como a Covid-19, não temos uma vacina definitiva para isso. O golpe violento se baseia na intimidação, na coerção e na eliminação; o golpe que se disfarça conta com a passividade de espectadores que assistem a tudo. Por isso, é inadmissível que pedidos por um “novo AI-5” sejam chancelados pela liderança que deveria ser responsável pelo resguardo da nossa democracia.
Democracia não é somente aguardar as eleições seguintes para sugerirmos as aprovações a uns ou outros elegíveis. O professor de política da Universidade de Cambridge, David Runciman, nos ajuda a entender que os ataques graduais as democracias ajudam a alimentar “os rumores de falência democrática, sem que ninguém tenha certeza de nada”. Já outro professor e historiador brasileiro, José Murilo de Carvalho, nos lembra de não subestimarmos a capacidade do Brasil de se sabotar.
Enquanto a Covid-19 se impõe como desafio global que afeta as economias, os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e conduz para a ampliação da miséria extrema, não podemos nos render à ruptura institucional, leniência com a tortura e com o autoritarismo disfarçado de autoafirmação nacional, que só serviria aos que pertencem aos grupos majoritários. Não podemos nos sabotar. Pleitear a liberdade sem democracia é pleitear a liberdade para alguns poucos. A maioria terá de se calar, tendo negada a sua dignidade e seus direitos, e por meio de coerção, violência, vigilância social, violações maciças, censura e poder policial.
Além da Covid-19 e seus riscos de morte, um desastre ainda maior seria aumentar a probabilidade de nos tornarmos vítimas de autoridades governamentais que não precisariam responder por seus atos. Isso é o que representaria a suspensão das instituições republicanas que controlam o executivo. Temos que ser solidários em relação aos que sofrem com a Covid-19, aos que trabalham na linha de frente, considerados essenciais, aos que enlutam hoje seus mortos, como aos que se aglomeram na pobreza e outros milhares de brasileiros para os quais a igualdade perante a lei ainda deve se concretizar do direito ao fato. Leis e, sobretudo, costumes, ajudam um povo democrático a continuar livre. O clima cultural geral deve ser de democracia, solidariedade, igualdade e liberdade.
Bolsonaro faz pouco do sistema que o elegeu e o tolera! Repudiamos, portanto sua irresponsabilidade, insensatez e o ataque à Constituição Federal, ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal. Repudiamos todo ato que defenda a ditadura e ignore o direito à verdade.
O Instituto Ethos não admitirá qualquer retrocesso institucional ou o rompimento da ordem democrática. E convida todos aqueles que prezam pela nossa democracia a se levantarem e fazerem o mesmo.
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