Taxação pode garantir US$ 900 bi até 2030, diz relatório; além de fundo para países em desenvolvimento, comunidades vulneráveis nos países ricos também seriam contempladas
Taxar grandes empresas produtoras de combustíveis fósseis sediadas em países ricos pode garantir US$ 900 bilhões em financiamento para a ação climática até 2030, calculou o relatório Climate Damages Tax (CDT, ou Imposto para Danos Climáticos). Lançado nesta segunda-feira (29/4), o documento foi elaborado em parceria por organizações da sociedade civil e defende o novo imposto como um mecanismo de justiça climática.
Partindo do princípio de que os países desenvolvidos, que mais contribuíram para a crise do clima, precisam assumir sua parcela de responsabilidade e apoiar ações de mitigação e adaptação em países em desenvolvimento, a proposta é que as petroleiras desses países, e não a população média, sejam as principais pagadoras dessa conta. “Já passou da hora de os produtores arcarem com uma parcela substancial dos custos pelos prejuízos resultantes da queima de combustíveis fósseis”, diz o relatório.
As organizações que elaboraram o documento – como Greenpeace, Climate Action Network e Stamp Out Poverty – propõem que o Imposto para Danos Climáticos seja utilizado para viabilizar a implementação do Fundo de Perdas e Danos aprovado na COP27 (a Conferência do Clima de 2022, no Egito) e operacionalizado na COP28, em novembro do ano passado, em Dubai. Além disso, defendem que uma parte da arrecadação seja destinada à ação climática nos próprios países ricos, favorecendo as populações mais vulneráveis.
“Taxar aqueles que lucram, e muito, com a principal causa dessa crise é uma questão de justiça”, analisa Stela Herschmann, assessora de Política Internacional do Observatório do Clima. “Aqueles que menos contribuíram para o problema são os que estão pagando o preço mais alto da crise do clima: perdendo suas vidas, casas e meios de sobrevivência. Recursos vindos dessa taxação podem ser direcionados para as comunidades afetadas, ajudando a minimizar os danos e a se preparar para os próximos eventos extremos, e também para financiar a transição energética, que precisa acontecer rapidamente”, completa.
O imposto incidiria sobre a extração de “cada tonelada de carvão, barril de petróleo e metro cúbico de gás”, considerando o quanto emitem em gases de efeito estufa. As organizações sugerem que as empresas fósseis paguem aos Estados, além de royalties ou similares, uma taxa extra vinculada ao volume de combustível extraído. Os Estados devem usar o valor arrecadado para garantir sua contribuição ao Fundo de Perdas e Danos “sem prejudicar injustamente seus cidadãos”, de acordo com o relatório, e reservar 20% da receita para ações domésticas de combate à emergência climática, como financiamento da transição energética e de políticas de adaptação.
A recomendação é que o imposto seja criado neste ano, a uma taxa inicial de US$ 5 por tonelada de CO2e, com aumento progressivo de US$5 por tonelada a cada ano. As organizações calculam que, se implementado nos países que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o novo imposto garantiria uma receita de US$ 44,6 bilhões para o Fundo de Perdas e Danos apenas em seu primeiro ano. Até o final desta década, seriam US$ 900 bilhões no total, sendo US$ 720 para o fundo e US$ 180 bilhões para investimento nos próprios países.
Considerando apenas os países do G7 (o grupo das sete maiores economias do mundo), US$33 bilhões seriam arrecadados para o Fundo de Perdas e Danos no primeiro ano. Até 2030, seriam US$675 bilhões no total (US$540 bilhões para o fundo e US$135bilhões para investimentos nacionais).
O relatório toma como exemplo as enchentes devastadoras que atingiram o Paquistão em 2022, inundando um terço do país e afetando 33 milhões de pessoas em um evento extremo atribuído às mudanças climáticas. Na ocasião, estimou-se danos em estrutura de US$ 14,9 bilhões e perdas econômicas de US$ 15,2 bilhões. O Paquistão solicitou apoio internacional, mas 90% dos fundos foram disponibilizados na forma de empréstimos, o que, segundo as organizações, apenas aprofunda a sobrecarga econômica do país em seu momento de maior fragilidade.
“Se o Fundo de Perdas e Danos existisse e fosse suficientemente financiado, o Paquistão poderia ter solicitado fundos sem custos para a reconstrução e recuperação de suas comunidades gravemente afetadas com resultados consideravelmente melhores em termos qualitativos para grande parte da população”, aponta o documento, lembrando ainda, que na outra ponta, estão os lucros recordes da indústria fóssil, que atingiram US$4 trilhões em 2022. A resposta da maioria dos países, segundo o relatório, foi aplicar impostos extraordinários. “Seria então um exagero pedir aos governos para irem além de impostos pontuais e aumentarem a carga tributária sobre a indústria como um todo anualmente?”, questionam as organizações.
A publicação do relatório antecede a primeira reunião do conselho do Fundo de Perdas e Danos, que debaterá seu financiamento na próxima terça-feira (30/4), em Abu Dhabi, e no momento em que os ministros de ambiente e energia do G7 se reúnem na Itália .
Por: Observatório do Clima
Foto: Leonardo.ai