Este país está começando a resgatar sua imensa dívida social. Aqui não há voo de galinha, e sim um progresso consistente e sustentado.        

Por Ladislau Dowbor*

Já era tempo que tivéssemos boas cifras sobre como anda o Brasil na sua base territorial. O Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013 apresenta a evolução dos indicadores nos 5.565 municípios do país. A confiabilidade é aqui muito importante. No caso, trata-se de um trabalho conjunto do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), que tem anos de experiência internacional e nacional de elaboração de indicadores de desenvolvimento humano, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e da Fundação João Pinheiro, de Minas Gerais, além de numerosos consultores externos. Os dados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Não há como manipular cifras, ou dar-lhes interpretação desequilibrada, com este leque de instituições de pesquisa.

Outro fator importante: o estudo cobre os anos de 1991 a 2010, o que permite olhar um período suficientemente longo para se ter uma imagem de conjunto, em vez de dramatizar cada oscilação segundo os interesses midiáticos. O fato de avaliar duas décadas também favorece uma interpretação mais isenta em termos políticos, pois se trata de administrações diferentes.

Para os leigos, lembremos que o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) apresenta a evolução combinada da renda per capita, da educação e da saúde. Isso permite desde já ultrapassar em parte a deformação ligada às estatísticas centradas apenas no produto interno bruto (PIB), que mede a intensidade de uso dos recursos, e não os resultados. Um desastre ambiental como o vazamento de petróleo no Golfo do México, só para dar um exemplo, elevou o PIB dos Estados Unidos ao gerar gastos suplementares com a descontaminação, “aquecendo” a economia. O fato de prejudicar o meio ambiente e a população não entra na conta. Aliás, a criminalidade também aumenta o PIB.

O dado mais global mostra que, nestas duas décadas, o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) passou de 0,493, ou seja, “Muito Baixo”, para 0,727, “Alto”. Isso representa um salto de 48% no período. Em 1991, o Brasil contava 85,8% de seus municípios no grupo “Muito Baixo”; em 2010, apenas 0,6%, ou seja, 32 municípios. O caminho que temos pela frente ainda é imenso. O Nordeste ainda apresenta 1.099 municípios, 61,3% do total, com índice “Baixo”, na faixa dos 0,50 e 0,60 do IDHM. Mas o que o dado geral representa para este país dividido é imenso: a interiorização do desenvolvimento.

A esperança de vida ao nascer passou de 0,493 em 1991 para 0,727 em 2010, o que significa que, na média, o brasileiro ganhou 9 anos extras de vida. No plano da educação, passamos de 30,1% para 54,9% a cifra de adultos com mais de 18 anos que tinham concluído o ensino fundamental. Em termos de fluxo escolar da população jovem, segundo indicador do item educação, passamos do indicador 0,268 em 1991 para 0,686 em 2010, o que representa um avanço de 128%. A área de educação é a que mais avançou, mas também continua a mais atrasada, pelo patamar de partida particularmente baixo que tínhamos. E, em termos de renda mensal per capita, passamos de 0,647 para 0,739 no período, o que representou um aumento de R$ 346.

São avanços extremamente significativos. Pela primeira vez o Brasil está começando a resgatar a sua imensa dívida social. Aqui não há voo de galinha, e sim um progresso consistente e sustentado. Por outro lado, os mesmos dados mostram o quanto temos de avançar ainda. É característico o dado de população de 18 a 20 anos de idade com o ensino médio completo: 13,0% em 1991, 41,0% em 2010. Grande avanço e imenso campo pela frente.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte:Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, p. 41

O documento é também importante porque nos dá um visão desagregada, no nível dos municípios. O IDHM 2013 apresenta uma ferramenta de primeira importância para os municípios, que passam a dispor de uma base de dados de cerca de 180 indicadores, desagregados por município, permitindo fazer comparações e acompanhar a evolução. O acesso é simples, com nome do município, em www.atlasbrasil.org.br. Uma análise do aporte pode também ser acessada em vídeo de 13 minutos, pelo link http://dowbor.org/2013/10/serie-atlas-brasil-2013-desenvolvimento-humano-em-debate-entrevista-com-ladislau-dowbor-outubro-2013-13-min.html/.

* Ladislau Dowbor é economista e professor titular no Departamento de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

 

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Este texto faz parte da série de artigos de especialistas promovida pela área de Gestão Sustentável do Instituto Ethos, cujo objetivo é subsidiar e estimular as boas práticas de gestão.

Veja também:
– A promoção da igualdade racial pelas empresas, de Reinaldo Bulgarelli;
– Relacionamento com partes interessadas, de Regi Magalhães;
– Usar o poder dos negócios para resolver problemas socioambientais, de Ricardo Abramovay;
– As empresas e o combate à corrupção, de Henrique Lian;
– Incorporação dos princípios da responsabilidade social, de Vivian Smith;
– O princípio da transparência no contexto da governança corporativa, de Lélio Lauretti;
– Empresas e comunidades rumo ao futuro, de Cláudio Boechat;
– O capital natural, de Roberto Strumpf;
– Luzes da ribalta: a lenta evolução para a transparência financeira, de Ladislau Dowbor;
– Painel de stakeholders: uma abordagem de engajamento versátil e estruturada, de Antônio Carlos Carneiro de Albuquerque e Cyrille Bellier;
– Como nasce a ética?, de Leonardo Boff;
– As empresas e o desafio do combate ao trabalho escravo, de Juliana Gomes Ramalho Monteiro e Mariana de Castro Abreu;
– Equidade de gênero nas empresas: por uma economia mais inteligente e por direito, de Camila Morsch;
– PL n° 6.826/10 pode alterar cenário de combate à corrupção no Brasil, de Bruno Maeda e Carlos Ayres;
– Engajamento: o caminho para relações do trabalho sustentáveis, de Marcelo Lomelino;
– Sustentabilidade na cadeia de valor, de Cristina Fedato;
– Métodos para integrar a responsabilidade social na gestão, de Jorge Emanuel Reis Cajazeira e José Carlos Barbieri;
– Generosidade: o quarto elemento do triple bottom line, de Rogério Ruschel;
– O que mudou na sustentabilidade das empresas, de Dal Marcondes;
Responsabilidade social empresarial e sustentabilidade para a gestão empresarial, de Fernanda Gabriela Borger;
Os Dez Mandamentos da empresa responsável, de Rogério Ruschel;
O RH como alavanca da estratégia sustentável, de Aileen Ionescu-Somers;
Marcas globais avançam na gestão de resíduos sólidos, de Ricardo Abramovay;
Inclusão e diversidade, de Reinaldo Bulgarelli;
Da visão de risco para a de oportunidade, de Ricardo Voltolini;
Medindo o bem-estar das pessoas, de Marina Grossi;
A quantas andam os Objetivos do Milênio, de Regina Scharf; e
Igualdade de gênero: realidade ou miragem?, de Regina Madalozzo e Luis Cirihal.