Com penas que vão de pesadas multas à própria dissolução, a nova lei vai punir empresas que receberem vantagem financeira decorrente de ato ilícito.
Pena de morte ou multa de até 20% sobre o faturamento: estas são duas das penalidades mais graves que as empresas poderão ter de enfrentar a partir do próximo dia 29 de janeiro, quando entra em vigor a nova Lei Anticorrupção Empresarial. A grande inovação na legislação é que a sentença de morte – ou seja, a dissolução da pessoa jurídica – não depende mais da comprovação de que algum administrador, funcionário ou agente da companhia participou intencionalmente de uma prática ilícita. Bastará que a empresa receba algum benefício decorrente desse ato para ser punida.
O setor de infraestrutura é o que reúne o maior número de segmentos afetados pelas novas regras. Isso porque as atividades que dele fazem parte pressupõem intenso relacionamento com o Estado. “A ideia central da nova lei é que as empresas observem todos os limites legais e éticos em sua relação com o poder público”, diz o advogado Igor Sant’Anna Tamasauskas, especializado em direito administrativo. Tamasauskas é sócio do criminalista Pierpaolo Cruz Bottini no escritório Bottini & Tamasauskas. Nos últimos meses, eles realizaram um profundo estudo sobre a nova lei, trabalho que em breve vai se transformar em livro.
Outra novidade trazida pela Lei Anticorrupção: passam a ser puníveis já na esfera administrativa as práticas definidas como ilegais em outras legislações. Nesse caso, caberá ao órgão público lesado aplicar a punição. O rol de penalidades prevê também a obrigação de publicar o teor da pena recebida em mídia de grande circulação.
Entre as práticas caracterizadas como ilícitas, a nova lei inclui oferecer vantagem indevida a funcionário público, inviabilizar licitações e receber benefícios decorrentes do reequilíbrio econômico-financeiro de um contrato feito de maneira irregular. As penalidades alcançam também quem financiar os atos considerados como prática de corrupção ou situações que levem a dificultar a fiscalização ou a investigação do caso.
Penas ainda mais duras poderão ser determinadas pelo Judiciário, que será o responsável, por exemplo, por determinar perda de bens, proibição de receber benefícios de órgãos ou instituições financeiras públicos, suspensão parcial de atividades ou a dissolução da empresa.
Também há previsão de algumas atenuantes, como a redução de até dois terços da pena de caráter administrativo. Esse benefício só valerá para empresas que tiverem mecanismos internos de prevenção a esses atos ilícitos – os chamados sistemas de compliance – e também para aquelas que colaborarem com as investigações, confessarem e encerrarem de imediato a prática corrupta. Esse acordo, no entanto, não protege as pessoas físicas envolvidas de punição. “A obrigação de manter um sistema de compliance, assim entendidos todos os mecanismos de integridade ética da empresa, é, ao mesmo tempo, uma garantia para a sociedade brasileira e para a empresa. Todos ganham com a atuação empresarial dentro do que a lei estabelece”, diz Bottini.
Inspirada no Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), dos Estados Unidos, a nova lei tem como principal foco empresas beneficiadas por atos de corrupção praticados aqui no Brasil, principalmente, mas também no exterior. Se a empresa recebeu vantagem indevida, estará sujeita às penalidades da lei.
Portanto, se uma companhia contratar serviços de terceiros para obter licença ambiental, por exemplo, e esses terceiros pagarem propina para acelerar a burocracia, ambos poderão ser punidos, tanto conforme as leis civis quanto na esfera administrativa. Essa inovação, embora polêmica, pode levar a uma transformação significativa nas relações entre as corporações e os funcionários públicos.
Por Andrea Michael e Maira Giosa, para o Instituto Ethos
Legenda da foto: Igor Sant’Anna Tamasauskas, advogado do escritório Bottini & Tamasauskas.