Em mais da metade das casas comandadas por mulheres ou pessoas autodeclaradas pardas, a fome foi vivenciada em alguns momentos entre 2017 e 2018.
A incerteza com a alimentação é crescente nessas famílias e também nas de pretos em comparação com as famílias comandadas por homens e brancos. Os dados são da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2017-2018 divulgada hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
No período estudado, o Brasil apresentou o pior nível de segurança alimentar desde 2004 — se comparado à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de anos anteriores, em 2013, 2009 e 2004. Em 2004, o índice era de 65,1%. Atualmente, está em 63,3%. Em 2013, melhor taxa da série, ele chegou a 77,4%.
Gênero e raça influenciam índice
A pesquisa revela que fatores como gênero e raça do responsável pelas despesas do domicílio impactam na escala, que avalia o nível de acesso a alimentos de qualidade e em quantidade suficiente. Mulheres e pessoas pretas e pardas possuem os índices mais altos de insegurança grave, na qual a fome é uma realidade dentro de casa.
Lares comandados por homens têm índices menores que os de mulheres. No caso deles, o nível de segurança alimentar é de 61,4%, contra 38,6%. Já no caso de insegurança alimentar grave as famílias comandadas por mulheres são maioria (51,9% contra 48,1%).
A maior vulnerabilidade das mulheres já havia sido observada na Pnad de 2013, mas observou-se que o aumento nos níveis de insegurança moderada e grave de 2013 para 2018 foi mais intenso entre as mulheres.
Em 2013, o nível de segurança alimentar entre homens era de 79,1%, enquanto entre as mulheres foi de 74,6%. Já no último levantamento, o dos homens oscilou para 66,8%. O das mulheres, para 58,5%.
A insegurança moderada e grave em 2013 entre homens foi de 6,9% contra 9,3% entre mulheres. Em 2018, esse nível era de 10,8 entre homens contra 15,3% em mulheres.
Já no recorte racial, observa-se que em domicílios cuja pessoa de referência se identifica como parda os níveis de insegurança cresceram, com o maior percentual concentrado na faixa da insegurança grave. Nessa população, o nível de segurança alimentar é de 36,9% — o de insegurança grave, é de 58,1%. Já entre os pretos, os índices são, respectivamente, 10% e 15,8%.
Nos casos em que o chefe de família se declara branco, o percentual de segurança está presente em 51,5% dos lares.
Pior índice desde 2004
O percentual de domicílios com insegurança alimentar leve sofreu o maior aumento de 2004 para 2018: de 18% para 24%. Já o contingente de lares onde há insegurança alimentar grave se mantém como índice mais baixo (4,6%), apesar de ter aumentado 3,2% nos últimos sete anos.
“Cerca de 3,1 milhões de domicílios passaram por privação quantitativa de alimentos, que atingiram não apenas os membros adultos da família, mas também suas crianças e adolescentes. Houve, portanto, ruptura nos padrões de alimentação nesses domicílios e a fome esteve presente entre eles, pelo menos, em alguns momentos do período de referência de 3 meses”, diz a pesquisa.
Os maiores níveis de insegurança alimentar puderam ser observados nos domicílios localizados nas áreas rurais brasileiras. São 7,1% contra 4,1% das áreas urbanas.
Entre as regiões, Norte e Nordeste, respectivamente, apresentam os maiores índices de insegurança, inclusive a grave. Já o Sul e o Sudeste têm os melhores índices de segurança alimentar.
“A Região Norte teve cerca de cinco vezes mais domicílios convivendo com a restrição severa de acesso aos alimentos, ou seja, com IA grave, quando comparada com a Região Sul (10,2% contra 2,2%)”.
A pesquisa também observou quais são os gastos das famílias de acordo com o nível de segurança alimentar. Em todos os perfis, a habitação é o que mais consome a renda, mas, nas famílias com insegurança alimentar grave, o gasto com alimentação vem logo em seguida. Já nas famílias com segurança, o transporte ocupa o segundo lugar nos gastos. Em todos os perfis, o menor gasto é com educação, mas nas casas com insegurança esse gasto é ainda menor.
A pesquisa foi feita por amostragem com 57.920 mil domicílios de todo o território nacional no período de junho de 2017 a julho de 2018.
Por: Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT)
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