O mundo que aguarda um jovem na casa dos 20 anos não é róseo. Pelas estatísticas da OIT, o futuro que ele vai precisar encarar é o desemprego.

Por Sérgio Mindlin*

Os jovens nas ruas deixaram evidente o mal-estar que sentem em relação ao “sistema”. As grandes manifestações de junho ainda desafiam os governos, os políticos, os especialistas e também as empresas. Afinal, qual é o recado que elas enviam?

As pesquisas feitas no calor da hora mostram que o perfil desse manifestante é de um jovem de classe média, seja da “nova” ou da tradicional, com menos de 25 anos, sem preferência partidária e participando pela primeira vez de um protesto político. Dos jovens manifestantes, 22% eram estudantes e, entre esses estudantes, 77% cursavam o ensino superior ou eram recém-formados.

A falta de um foco específico – ou talvez por isso mesmo – deixou claro o mal-estar que esses jovens sentem em relação a “tudo que está aí”. Isso porque o mundo que aguarda um jovem na casa dos 20 anos não é róseo. Se as estatísticas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) estiverem corretas – e elas costumam estar –, o futuro que esse jovem de hoje vai precisar encarar é o desemprego.

No documento Tendências Mundiais do Emprego Juvenil 2013, que foi lançado em maio, a OIT ressalta que a taxa mundial de desemprego entre jovens de 15 a 25 anos está em 12,4%, mas varia muito de região para região. Ela é mais alta no Oriente Médio e na África do Norte, com 28,3% e 23,7%, respectivamente, e mais baixa na Ásia, com 9,5%. Na América Latina e Caribe, o desemprego juvenil está em torno de 12%. A OIT destaca que, embora o crescimento econômico nessa região tenha produzido melhoras na situação laboral, os jovens não foram os mais beneficiados. Os empregos formais, “de carteira assinada”, são menos acessíveis aos jovens, que se veem obrigados a aceitar trabalhos temporários ou de meio período e, muitas vezes, desistem de esperar pela “oportunidade de ouro”, o emprego com um bom salário numa empresa tradicional. Por isso, a média da taxa de desocupação juvenil é quase o dobro da adulta que, na região, está em 6%, segundo a própria OIT.

Como a perspectiva de um trabalho fixo e bem remunerado se torna cada vez mais distante, muitas pessoas em fase de formação escolar decidem abandonar os estudos e passam a engrossar a camada dos “nem-nem” – nem estudam, nem trabalham.

No Brasil, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) calcula em 22,6% a porcentagem de desemprego entre os jovens de 16 a 24 anos, no final de 2012. Essa porcentagem foi divulgada na newsletter Canal RH do último dia 11 de julho.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) informou, no final do ano passado, que, entre os anos 2000 e 2010, o número de jovens que não estudam, não trabalham e não procuram emprego aumentou em 708 mil indivíduos. A proporção passou de 16,9% para 17,2% das pessoas entre 15 e 29 anos.

Desemprego em baixa, menos para jovens

A taxa de desemprego no país está em 5,7%, a menor da história. Por que a da população mais jovem não se encontra no mesmo patamar?

Uma das explicações é que os jovens não costumam parar muito tempo num emprego. Outra é a de que há ainda no país uma defasagem entre as habilidades e competências adquiridas na escola e aquelas exigidas pelas empresas. Assim, na hora de contratar, uma pessoa com maior experiência acaba sendo selecionada.

Há ainda uma questão recorrente quando se fala nas oportunidades para jovens: trata-se da baixa escolaridade.

A escolaridade média do brasileiro é de 7,2 anos de estudo, segundo a ONU, ou de 7,4 anos, segundo o Ministério da Educação (MEC). De qualquer forma, é uma das menores médias da América do Sul. A evasão escolar no ensino fundamental é de 24,3%, também uma das maiores do continente.

Como a exigência para ocupar as vagas nas empresas só aumenta e a escola, principalmente a pública, é desinteressante e sem qualidade, o jovem deixa os estudos e acaba também desistindo de procurar emprego. Se juntarmos o potencial de insatisfação desse jovem com o de outros que, mesmo empregados, não veem futuro na vida que levam, temos as condições para as manifestações que ainda sacodem o país.

Qual a saída?

O mundo precisa “ter graça” para esses jovens. Portanto, o desafio brasileiro, daqui para a frente, é encontrar um modelo que faça avançar a qualidade de vida. Isso coloca um repto para os governos e para as empresas também. As companhias precisam reforçar o investimento nos jovens talentos, pois eles serão os técnicos e executivos que levarão à frente os negócios. A “visão de futuro” precisa superar a ideia mais imediatista de custo, pois será necessário investir em capacitação.

A já citada newsletter Canal RH traz o exemplo da BDF Nívea Brasil, que contrata profissionais em início de carreira tanto em processos de recrutamento e seleção tradicionais quanto por meio do programa Jovens Aprendizes, com a finalidade de formar talentos dentro da própria empresa e permitir que eles cresçam lá dentro.

Os processos de trainees costumam ser excelente porta de entrada em grandes empresas para quem está saindo da faculdade. As grandes empresas abrem inscrições para trainees normalmente nos finais de ano, oferecendo vagas em várias áreas de formação, de engenharia a comunicação. Normalmente, esses processos duram de um a dois anos, ao final dos quais muitos dos treinandos acabam contratados pela empresa.

Mas, para atrair o jovem “nem-nem”, a empresa precisa ter “algo mais”. Precisa entender o anseio dele e a contribuição que ele pode dar para a melhoria dos negócios, da comunidade e da própria sociedade. Não é um desafio simples de ser enfrentado e não cabe só à empresa fazê-lo. Governos também devem inovar em políticas públicas de educação, cultura e seguridade social. Se essas políticas forem mescladas com ações empresariais que garantam emprego interessante ao jovem e, ao mesmo tempo, oportunidade para ele voltar a estudar, por exemplo, numa sala de telecurso na própria empresa, é possível estarmos encaminhando uma solução não tradicional para um dos mais sérios desafios que o Brasil precisa superar.

O desafio do século XXI– no Brasil e no mundo – é atender as necessidades da imensa parcela da humanidade excluída dos direitos e do bem-estar. Não se trata apenas de “vender”, mas de entender o que essas pessoas precisam e oferecer-lhes soluções, colocando o mercado a serviço da sociedade, e não o contrário, como ocorre na sociedade de consumo de massa.

É isso o que os jovens do Brasil e do mundo gritam nas ruas, a seu jeito e em seu idioma próprio.

* Sérgio Mindlin é presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Ethos.