Os egressos do sistema prisional chegam à empresa com desejo de recomeçar e fazer a diferença, semelhante a qualquer outra pessoa.
Por Maurílio Leite Pedrosa*
À medida que cresce a criminalidade no Brasil, seus efeitos são multiplicados exponencialmente. A população carcerária nacional já atingiu o quarto lugar no ranking mundial – mais de 550 mil pessoas – e os investimentos relativos à prevenção e ao enfrentamento de crimes e ações de proteção individual equivalem a cerca de 5% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea). Por outro lado, a sociedade passa a demandar vingança, em vez de recuperação do indivíduo. Cabe, então, uma reflexão: será que estamos enfrentando o problema da melhor maneira?
Na organização Minas Pela Paz, desenvolvemos ações que visam a prevenção da criminalidade em sua essência, por meio de programas que promovam a inclusão de crianças e adolescentes através da cultura, da educação e do esporte. Mas também é dada a devida atenção para aqueles que cometeram erros no passado e querem reconstruir suas vidas.
O Programa Regresso dedica suas atividades à ressocialização de egressos e apenados do sistema prisional, promovendo a inclusão por meio da qualificação profissional e do trabalho. Desde 2009, ano de lançamento do projeto, cerca de 2500 apenados concluíram cursos de formação educacional e de capacitação profissional e mais de 700 apenados e egressos foram contratados. Os números ainda estão aquém das oportunidades, se pensarmos na realidade do mercado de trabalho brasileiro. O principal obstáculo é o preconceito.
A cada ano, cerca de 20 mil egressos são libertados e se deparam com uma realidade diferente da que deixaram para trás, após a perda da liberdade. Muitas vezes, sem o apoio de amigos e familiares, e com baixa qualificação, a entrada ou o retorno ao mercado de trabalho se torna um desafio diário, principalmente quando as empresas exigem o atestado de bons antecedentes.
Estudos dedicados ao tema revelam que a maior parte das reincidências criminais ocorre porque não é oferecida aos egressos uma oportunidade de trabalho digna. No Brasil, a reincidência entre os ex-sentenciados cai de 80% (média nacional) para 48%, quando estes trabalham.
A mudança dessa realidade está diretamente ligada à abertura da sociedade e das empresas ao tema. Diferente do que o senso comum presume, a contratação desses profissionais é semelhante à de qualquer outra pessoa. Os egressos, na maioria das vezes, chegam à empresa com o desejo de recomeçar e fazer a diferença. E, por terem uma bagagem cultural semelhante à de outros colaboradores, principalmente, os de nível operacional, se adaptam ao cotidiano e à rotina empresarial.
Em Minas Gerais, berço dessa iniciativa, o Estado oferece uma subvenção econômica às empresas que contratarem egressos e apenados do sistema prisional, por meio da Lei 20.624/13. Após a assinatura do termo de compromisso, as empresas recebem dois salários mínimos por mês para cada contratado egresso ou condenado em cumprimento de prisão domiciliar, nos primeiros dois anos do contrato de trabalho.
Para garantir o desenvolvimento do egresso, a empresa conta com o apoio da Secretaria de Estado de Defesa Social, por meio do Programa de Inclusão Social de Egressos do Sistema Prisional (Presp), que disponibiliza, durante o primeiro ano, o apoio jurídico, social e psicológico ao ex-detento.
A união de esforços dos três setores da sociedade – governo, terceiro setor e iniciativa privada – tem contribuído para a construção de um novo paradigma, em que o indivíduo que pagou sua dívida com a Justiça tem a oportunidade de reescrever sua história. O trabalho pode não resolver 100% dos casos, mas é fato que contribui de forma relevante para a recuperação de cidadãos que buscam uma segunda chance.
*Gestor de defesa social do Minas Pela Paz
Saiba mais sobre o Programa Regresso e outras iniciativas do Instituto no site www.minaspelapaz.org.br