Até 300.000 meninos e meninas poderiam retornar ao trabalho infantil devido ao impacto da crise
O evento de lançamento do Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil na América Latina e no Caribe, que permitiu à Organização Internacional do Trabalho (OIT) convocar, no dia 11/02, presidentes, governos, empregadores, trabalhadores, sociedade civil e personalidades da região, evidenciou que há consenso em torno à necessidade de redobrar os esforços para evitar que a crise da Covid-19 se traduza em retrocesso nos avanços alcançados.
“Este Ano Internacional não se trata de falar, se trata de fazer”, disse o diretor-geral da OIT, Guy Ryder, em sua mensagem para esse encontro regional. “Pedimos a todos que se comprometam para que tenhamos melhores chances de alcançar nossa ambiciosa meta dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS): eliminar o trabalho infantil até 2025.”
O lançamento contou com mensagens dos presidentes da Colômbia, Iván Duque; da Guatemala, Alejandro Giammattei; e do Peru, Francisco Sagasti; além do vice-presidente da Costa Rica, Marvin Rodríguez, e do ministro do Trabalho e Previdência Social da Jamaica, Karl Samuda.
O evento de alto nível também incluiu intervenções do ganhador do Prêmio Nobel da Paz, Kailash Satyarthi; da ex-trabalhadora doméstica infantil e ativista peruana, Sofía Mauricio; do representante da Organização Internacional de Empregadores (OIE), Alberto Echavarría; do representante da Confederação Sindical dos Trabalhadores e das Trabalhadoras das Américas (CSA), Cícero Pereira da Silva, da secretária-executiva da CEPAL, Alicia Bárcena, e do subdiretor regional do UNICEF para a América Latina e o Caribe, Youssouf Abdel-Jelil.
De acordo com a OIT, nos últimos 25 anos, a região da América Latina e o Caribe conquistou avanços importantes, pois 9,5 milhões de crianças e adolescentes deixaram de trabalhar, especialmente em atividades perigosas. No entanto, antes da pandemia, ainda existiam 10,5 milhões crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil.
O cenário pode piorar devido à crise gerada pela Covid-19. O diretor-geral da OIT destacou que “o aumento da pobreza, a queda da renda familiar, o fechamento de escolas e o aumento das vulnerabilidades são fatores que podem contribuir para o aumento do trabalho infantil”.
Segundo dados da OIT e da CEPAL divulgados em junho de 2020, até 300.000 meninos e meninas poderiam retornar ao trabalho infantil devido ao impacto da crise.
“Diante do recrudescimento da emergência sanitária, do prolongamento das medidas especiais de confinamento e distanciamento e da persistência da crise nos últimos meses, esta situação está se agravando”, disse o diretor da OIT para a América Latina e Caribe, Vinícius Pinheiro, na abertura do evento.
Neste momento devemos “pisar no acelerador” no combate ao trabalho infantil, para seguir avançando e enfrentar uma crise que “pode fazer retroceder em um ano o equivalente a uma década de progressos”, acrescentou.
O presidente da Colômbia, Iván Duque, destacou que o compromisso é prevenir e continuar reduzindo o trabalho infantil na sociedade, em vídeo-mensagem acompanhado da primeira-dama Juliana Ruiz. Ele destacou a necessidade de redobrar esforços e alertou que “isso é vital agora que enfrentamos os desafios da Covid-19.”
O presidente da Guatemala, Alejandro Giammattei, ressaltou, durante o lançamento do Ano Internacional, o compromisso político “no mais alto nível” com a prevenção e a erradicação do trabalho infantil em todas as suas formas. “Nós nos juntamos a esta iniciativa global a fim de fortalecer os esforços para combater este flagelo”.
O presidente do Peru, Francisco Sagasti, relacionou a persistência do trabalho infantil, um problema e uma tragédia que atinge o mundo inteiro, à “desigualdade endêmica em nossa região” e reiterou o compromisso de seu país com a aplicação de estratégias para enfrentar esse problema.
Os três presidentes destacaram a Iniciativa Regional para América Latina e Caribe Livre do Trabalho Infantil, uma plataforma tripartite que desde sua criação em 2014 está empenhada em buscar novas respostas para as faces emergentes do trabalho infantil. Trinta países da região, sete organizações de empregadores e sete organizações de trabalhadores participam da Iniciativa.
O ganhador do Prêmio Nobel da Paz Kailash Satyarthi, ativista internacional contra o trabalho infantil que participou do lançamento regional, lembrou que “temos conhecimento do problema, sabemos quais são as soluções, temos tecnologia” para enfrentá-lo. Ele disse que o Ano Internacional deve se traduzir em avanços concretos.
A ideia de celebrar o Ano Internacional surgiu na IV Conferência Mundial sobre a Erradicação Sustentada do Trabalho Infantil, realizada em Buenos Aires em 2017. Dois anos depois e graças ao trabalho ativo da Chancelaria argentina, na 73ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em julho de 2019, 78 países manifestaram apoio à Resolução para declarar 2021 como o Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil.
A OIT destacou no lançamento regional que será necessário apostar em ações conjuntas cada vez mais efetivas, baseadas no diálogo social e que reúna todos os atores públicos e privados envolvidos na resposta à persistência do trabalho infantil.
Durante o lançamento, o depoimento da ativista e ex-trabalhadora infantil peruana Sofía Mauricio foi particularmente emocionante. “Aos 12 anos me tornei babá… Minha história não é só minha. Nos movimentos de combate ao trabalho infantil doméstico, vi que ele se repete em milhões de meninas e meninos”.
“Faço um chamado aos governos para que estabeleçam políticas de erradicação e de prevenção do trabalho infantil, que garantam a proteção das pessoas vulneráveis e assegurem uma educação de qualidade”, acrescentou ela.
Para o grande público reunido para este lançamento nas plataformas virtuais, o diretor da OIT para a América Latina e Caribe, Vinícius Pinheiro, destacou que “estamos perante um problema multicausal que exige respostas de carácter econômico, social, político e também cultural para transformar padrões que perpetuam visões e percepções sobre a infância e adolescência que limitam seu potencial e sua capacidade de se projetar”.
“Conhecemos o problema, sabemos o que funciona para resolvê-lo. É hora de agir de forma decidida, com políticas e orçamentos suficientes para preservar o que conquistamos e, em vez de retroceder, avançar com o objetivo de erradicar o trabalho infantil.
“Diante desse problema, a indiferença é uma forma de cumplicidade”, disse Pinheiro ao encerrar o lançamento do Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil na América Latina e no Caribe.
Por: ONU Brasil
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil