Por: Natália Paiva, diretora-executiva do Movimento pela Equidade Racial (Mover)

Em sua mais nova edição, o Perfil traz uma série de elementos importantes para a compreensão das dinâmicas de desigualdade no ambiente corporativo brasileiro, mas um em especial chama a atenção: o consenso entre executivos de que as disparidades raciais representam a mais crítica lacuna quando se olha para as lideranças empresariais. Entre 2015 e 2023, vale dizer que houve um aumento de 22 pontos percentuais no número de executivos que reconhecem que a presença de pessoas negras em cargos do Executivo e da Diretoria está “abaixo do que deveria ser” – com 86% dos entrevistados admitindo essa realidade. Nos Conselhos de Administração, o cenário é semelhante: 86,9% afirmam que o número de conselheiros negros nesses postos é insuficiente.

Essa percepção reflete uma realidade inescapável: pessoas pretas e pardas compõem menos de 6% dos Conselhos e menos de 14% dos cargos do Executivo e da Diretoria, apesar de representarem 55% da população. Não se trata de mero acaso. O racismo estrutural continua a impedir que essas pessoas alcancem todo o seu potencial e sejam reconhecidas como líderes. No entanto, ao serem questionado sobre as razões para essa baixa proporção, os executivos indicam três fatores principais: a ausência de programas de liderança, a falta de políticas e práticas afirmativas e a suposta falta de qualificação de pessoas negras para cargos de liderança.

Aqui se apresenta o primeiro desafio: nos dois primeiros casos, as empresas, como agentes do poder econômico, podem não apenas reconhecer essa lacuna, mas também investir ativamente na capacitação de profissionais negros. Isso exige comprometimento das lideranças atuais, alocação de recursos, estabelecimento de planos e metas com responsabilidade compartilhada e, acima de tudo, o reconhecimento de que essa é uma agenda complexa, que precisa ser transversal e multifuncional, e não uma tarefa isolada de um “time de diversidade” frequentemente subdimensionado e com orçamento insuficiente.

Quanto à terceira razão – a suposta falta de pessoas negras qualificadas para cargos de liderança –, é preciso ir além da superfície. Sim, é crucial investir na capacitação e na formação de pessoas negras para superar as disparidades socioeducacionais históricas. Há de se observar, porém, que os talentos negros abundam sim, mas que estes seguem sub-representados no mercado. Em paralelo a isso, a ideia de liderança muitas vezes segue engessada em um molde fixo para o qual se demanda prontidão – na prática, a mentalidade de crescimento segue reservada ao status quo, que se beneficia de mentores, sponsors e programas de liderança (pessoas negras têm muito menos acesso a esse ferramental).

Portanto, enfrentamos dois desafios: criar ambientes propícios para a progressão de carreiras e superar os obstáculos decorrentes das disparidades socioeducacionais. As respostas para esses desafios estão sendo encontradas em ações como as do Movimento pela Equidade Racial (Mover), uma associação sem fins lucrativos que, por meio da conscientização, do compartilhamento de boas práticas e do fomento ao desenvolvimento profissional de pessoas negras, busca promover e acelerar a equidade racial no setor privado.