Passado o segundo turno das eleições nacionais brasileiras, reiteramos a necessidade de pensarmos novos caminhos para um desenvolvimento econômico no Brasil que tenha como prioridade absoluta o combate às desigualdades, a responsabilidade socioambiental e a promoção da paz e justiça. Nos últimos quatro anos, o Brasil passou de liderança mundial no enfrentamento à crise climática a pária internacional, se recusando a cumprir com os objetivos climáticos uma vez assumidos e abrindo mão de sua posição como negociador chave. Fez uso de estratégias de desestruturação institucional e precarização de órgãos de fiscalização, comando e controle, bem como, apresentou duas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) menos ambiciosas. Todas essas opções e escolhas indicaram uma clara aventura predatória, movida pela desregulamentação, e contrária ao caminho da neutralização de emissões a nível internacional.
Espera-se que a partir de 2023, possamos vislumbrar um novo comprometimento com a política ambiental brasileira que recoloque o país no rumo de emissões neutras, e idealmente negativas, para 2050. Para isso, será necessário o fortalecimento da regulação ambiental para que passe a oferecer condições para a adaptação dos diversos, e principais, setores econômicos que compõem tanto a matriz econômica, quanto aos setores que compõem a matriz de emissões brasileira. Será preciso endereçar de maneira efetiva o combate à ampliação da fronteira do desmatamento, hoje o principal emissor de GEE no Brasil e, para isso, será preciso ter clareza sobre o posicionamento do poder público na indicação sobre meios de implementação e quais serão as estratégias adotadas para promover o engajamento do setor privado brasileiro de forma alinhada às novas exigências de investimento, capaz de competir igualmente em mercados internacionais, de forma muito mais atenta aos impactos socioambientais das diversas cadeias produtivas.
Ademais, o aperfeiçoamento do relacionamento público privado se faz urgente. Evitar pontos de não-retorno e inflexão ecossistêmicas devem ser entendidos como prioritários. Modelagens científicas, das mais diversas, apontam o ponto máximo de aumento da temperatura, o 1,5ºC, pode ser atingido até mesmo antes de 2030. Portanto, a ação imediata é urgente para que consigamos manter este nível de aumento de temperatura, ainda saudável, até o final do século.
O papel do setor privado se faz essencial. É imprescindível que as lideranças empresariais se coloquem na dianteira do combate à mudança climática, em um mundo progressivamente mais atento às boas práticas para a manutenção da competitividade do setor privado brasileiro, que necessariamente passará pela adoção de práticas responsáveis em sua atuação. Além da preocupação com o papel dos Estados nacionais no endereçamento ágil de sua matriz de emissões, o setor privado ganha protagonismo ao ser inserido nos programas de descarbonização oficiais, tal qual o Balanço Global (Global Stocktake), buscando a ampliação da rede de atores comprometida com práticas ambientalmente responsáveis.
A COP27 coloca desafios essenciais para se alcançar os objetivos do Acordo de Paris. Além de metas ambiciosas, os diferentes atores devem demonstrar meios de implementação factíveis e passar a prever, em termos de governança e orçamento, financiamento para perdas e danos em decorrência do aumento de eventos climáticos extremos, além de estimular um aumento de transparência para demonstrações financeiras alinhadas com os objetivos de descarbonização, promovendo práticas de integridade e transparência em toda sua cadeia de valor. Em alinhamento com a discussão sobre regulação climática, o setor empresarial deve exigir uma estruturação rápida e adequada sobre mecanismos financeiros para apoiar o processo de adaptação, tais como a estruturação de mercados de carbono, pagamento por serviços ambientais e, eventualmente, pagamento por emissão evitada (avoidance).
O encontro no Egito será marcado pela discussão fundamental a respeito da desigualdade climática. Hoje o território Afriacano é o que mais enfrenta extremos climáticos e o que menos contribui para as emissões globais. Portanto, uma nova abordagem da literatura climática é necessária. A ciência aponta os objetivos que a adaptação à mudança do clima existe e vai além, aponta caminhos para a mitigação e reparação atrelando a agenda climática à agenda de direitos humanos, manutenção da qualidade de vida e combate às desigualdades. Assim, buscar transversalidades entre as agendas de meio ambiente e direitos humanos se torna parte crucial do enfrentamento à mudança do clima, trazendo para o centro da tomada de decisão as mais diversas populações mundiais e suas percepções sobre o impacto da mudança do clima em seu cotidiano. Ademais, a conciliação entre desenvolvimento econômico e proteção ambiental é essencial para pensarmos negócios do futuro e reduzir impactos da ação empresarial sobre os ecossistemas e populações. Convenciona-se que o valor e o custo da inação à mudança do clima é superior ao valor do investimento em adaptação e mitigação, portanto a ação fortemente coordenada e eficiente se torna prioridade durante a tomada de decisão.
A presença do Instituto Ethos COP 27 será pautada pelo alinhamento entre as agendas de meio ambiente e direitos humanos, promovendo boas práticas de governança e assistencialismo aos eventos climáticos extremos que, por sua vez, configuram o que se convenciona chamar de mudança do clima. O aumento da degradação ambiental está associada à violação dos direitos humanos, exemplo claro se apresenta na região amazônica que devido a redução da regulação, fiscalização e controle da fronteira do desmatamento apresenta hoje índices altíssimos de assassinatos a lideranças comunitárias, bem como destruição dos ecossistemas, qualidade imprescindível para a manutenção de estilos de vida humanos.
No mais, o Instituto Ethos traz como principal expectativa ao novo governo a apresentação de metas climáticas progressivamente mais ambiciosas e que venham associadas à indicação sobre meios de implementação, seguindo portanto, o entendimento expresso no Acordo de Paris. Além disto, espera-se que a agenda ambiental seja compreendida em sua complexidade e capacidade de impacto nos diferentes modos de vida, portanto o combate às desigualdades e justiça socioambiental devem ser eixos principais para o novo modo de condução da política climática brasileira.