Ela cria o “caldo de cultura” necessário para o sucesso da empresa

(*) Paulo Itacarambi

Terminou ontem em São Paulo o 14o. Congresso Internacional de Governança Corporativa, organizado pelo IBGC e que discutiu os principais desafios para o desenvolvimento de uma boa governança corporativa, tais como: funcionamento dos conselhos de administração; instalação de gestão de risco e compliance; desafios das políticas e práticas de integridade; melhores práticas de relato integrado; valores que devem ser garantidos por uma boa governança.

Para que esses sistemas sejam efetivos e funcionem de acordo com os objetivos da empresa, existe uma questão central a ser enfrentada: o correto e adequado tratamento das informações que a empresa vai por à disposição dos órgãos reguladores e do conjunto dos públicos com os quais se relaciona.

Resolver essa questão e encontrar a maneira de informar mercado, governos e sociedade possibilitará à empresa fazer com quem esses públicos tenham confiança nas instâncias criadas pela empresa. E confiança é condição indispensável ao sucesso do negócio.

O que informar?

A boa gestão de risco e compliance, as práticas de integridade e de relato, enfim, os próprios valores da empresa pressupõem um monitoramento constante sobre os ativos e passivos econômicos e socioambientais da empresa e de sua cadeia de valor cuja responsabilidade sobre problemas pode recair na empresa. Por exemplo: uma denúncia de trabalho escravo em um fornecedor compromete a empresa que compra os serviços dele. Recentemente, vimos como marcas famosas da indústria têxtil precisaram adotar programas de ajuste de conduta por conta de flagrantes de trabalho análogo à escravidão na cidade de São Paulo. Denúncias de fraude e corrupção em alguns elos da cadeia de valor  também têm comprometido a reputação de muitas empresas que são âncoras daquela cadeia de valor.

Portanto, é imprescindível obter continuamente as informações do negócio. E, mais do que isso, é preciso disponibilizá-las aos diversos públicos, na forma e na medida que lhes interessa, para que nenhum fato relativo à empresa pegue de surpresa algum stakeholder. Surpresas podem quebrar a confiança e derrubar o valor da empresa, como vimos ocorrer, por exemplo, na crise de 2008 e, mais recentemente, aqui no Brasil, com um grande grupo de companhias.  Tudo o que parecia sólido desmanchou-se no ar porque, simplesmente, as informações vitais para decisão de acionistas e investidores, e para conhecimento dos públicos de interesse, estavam incorretas.

É preciso lembrar que, hoje, mais do que acionistas e governos, a sociedade está acompanhando com cada vez mais interesse, o que faz uma empresa, como ela funciona, de onde vêm os insumos para a produção, como ela trata seus funcionários, e assim por diante. Um bom sistema de monitoramento do desempenho das áreas deve garantir esse fluxo de informações confiáveis.

Mas, como saber se são confiáveis?

Podemos confiar em empresas cujo monitoramento está baseado não só em controles, como também em diálogo e engajamento das partes interessadas. Diálogo franco e aberto também é garantia de que as informações são confiáveis. Pois, para haver diálogo, é preciso que haja relacionamento com esses públicos, no qual as partes podem conversar  com base em compromissos assumidos de lado a lado. Isso é transparência. Ela é, muitas vezes, confundida com o relato das atividades, mas este é apenas seu instrumento. A transparência é dada pelo diálogo com o público interno, os acionistas, os fornecedores, e pela forma como trata as informações trazidas por eles nos relatos impressos e na comunicação com a mídia, principalmente nos momentos de crise.

Transparência , portanto, é base indispensável para criar o “caldo de cultura” para o sucesso da empresa.

Desse caldo também faz parte, como ingrediente fundamental, a confiança, um bem cada vez mais escasso no Brasil e no mundo, conforme mostrou a pesquisa Barômetro da Confiança, feita pela Edelman e que já comentamos aqui.

Os dados do Barômetro

De acordo com essa pesquisa, que entrevistou mais de quatro mil pessoas  em 25 países, a principal razão para os brasileiros não confiarem nas empresas é a falta de transparência, com 29% das respostas. Corrupção ou fraude vem a seguir, com 21% das respostas. Nos outros países, a transparência é a razão para 16% dos entrevistados, sendo a corrupção a alternativa mais votada, com 27% das respostas.

Outro resultado interessante é aquele que aponta a credibilidade dos CEOs. No Brasil, ocupam o 9º. lugar. 48% dos entrevistados não os consideram confiáveis, porque não costumam falar a verdade sobre suas empresas, principalmente numa situação de crise.

Globalmente, os presidentes de empresas ficaram em penúltimo lugar (com 43% das respostas) na lista dos atores sociais em que população rica e escolarizada mais confia, atrás apenas de reguladores e do governo.

O ranking dos mais confiáveis é liderado internacionalmente por acadêmicos ou especialistas (69%). No Brasil, é liderado pelas pessoas comuns.

Os públicos interessados cada vez mais confiam em “pessoas comuns”, como empregados, funcionários públicos, bem como em especialistas e acadêmicos. De acordo com a Edelman, essas pessoas desfrutam do dobro da confiança de um CEO ou de um ministro ou funcionário de alto escalão de um Estado. Talvez por isso, em nosso país, a confiança nas empresas é maior do que a confiança nos empresários em 32 pontos; e, nos governos, 28 pontos maiores do que nos governantes.

Manipulação e concorrência

Num ambiente altamente competitivo, o dilema das empresas é ser transparente e, portanto, organizar as informações de modo a prestar contas aos seus públicos, sem se expor à concorrência.

Uma das maneiras encontradas por algumas companhias para enfrentar esse desafio é criar mecanismos independentes de monitoramento e auditoria, externos às estruturas do próprio negócio, que têm liberdade para “vasculhar” os arquivos e garantir a credibilidade necessária.

A Fibria, por exemplo, submete seu relatório financeiro e de sustentabilidade a uma análise externa independente, que avaliza as informações ali declaradas.

Com isso, dá a garantia de que a “pessoa comum” necessita para confiar no que a empresa está relatando.

Por serem mais robustos, esses sistemas independentes talvez sejam a alternativa para as empresas ampliarem a transparência e o diálogo com seus públicos.

(*) Paulo Itacarambi é vice-presidente do Instituto Ethos.