Ray Anderson: “Conseguimos economizar US$ 336 milhões desde 1995”
É do chão que nasce a sustentabilidade Com práticas ambiental e socialmente corretas a Interface muda a maneira de fabricar tapetes
Françoise Terzian Para o Valor, de São Paulo
Para alguns, Ray Anderson é apenas um engenheiro industrial de 73 anos, natural da Georgia (EUA), que fundou uma fábrica de carpetes há 35 anos e teve a sorte de transformar sua idéia em um negócio que vende US$ 1.1 bilhão por ano. Hoje, a Interface Co, sediada em Atlanta, é a líder mundial de carpetes modulares, com 38% de participação
de mercado e presença em cem países. O concorrente mais próximo tem 11% do mercado.
Para a maioria dos empreendedores e visionários americanos, no entanto, Anderson é considerado um dos empresários mais criativos, inovadores e ambientalmente responsáveis da atualidade. Foi ele quem introduziu nos Estados Unidos o conceito de carpete em módulos — o que evita o desperdício do rolo — e também o carpete antibactericida, já usado em hospitais como o Massachusetts General Hospital. E mais: a modalidade de “aluguel de carpetes”, com direito à reciclagem integral do produto, foi idéia dele.
O plano mais ambicioso de Anderson, no entanto, é salvar o planeta do aquecimento global. A indústria de carpetes demanda muito petróleo, derivados de petróleo, água e energia. Anderson quer transformar a Interface numa empresa 100% sustentável até 2020.
“Quando este dia chegar, usaremos 0% de água e 100% de matérias-primas renováveis na produção dos nossos carpetes”, promete.
Em maio ele desembarca no país para participar da Conferência Internacional do Ethos 2008. Anderson conversou por telefone com o Valor , de Atlanta, e adiantou algumas de suas idéias sobre inovação e sustentabilidade.
Valor: Sua empresa sempre teve como característica a busca pela inovação e preservação do meio ambiente?
Ray Anderson: Fundei a empresa com minhas economias e a ajuda de amigos. Desde o início sempre vi na inovação e na tecnologia diferenciais para o negócio crescer e satisfazer o consumidor. Em 1973 havia poucos concorrentes e um mercado enorme para se trabalhar.
Resolvi apostar na inovação e importei tecnologias e processos criados na Inglaterra e realizei melhorias. Foi daí que a Interface introduziu nos Estados Unidos o conceito de carpetes modulares — no lugar do rolo —, ajustando o produto aos espaços mínimos dos escritórios. De lá para cá, o mercado explodiu. Com o tempo, passamos a inovar ainda mais. Atribuo à inovação o fato de termos nos tornado, 15 anos depois da fundação da empresa, os líderes do mercado mundial de carpetes. Já a preocupação com o meio ambiente incorporou-se à pauta na década de 90, depois que percebemos a necessidade de responder aos questionamentos de nossos clientes.
Valor: Quais as estratégias usadas para se manter na liderança do mercado mundial há 20 anos?
Anderson: Atribuo a liderança a vários motivos. O primeiro porque fazemos os melhores carpetes do mundo. Investir e manter a qualidade são itens obrigatórios em um mundo cada vez mais exigente.
O mercado de carpetes de forma geral encontra-se estabilizado, com alguns segmentos registrando crescimento na faixa dos 7% ao ano. Obviamente, continuamos a investir em inovação e em setores variados. Temos buscado novas aplicações que satisfaçam os clientes de diferentes segmentos. Não atendemos só escritórios, mas também lojas de departamento, museus, bibliotecas, escolas, universidades e hospitais.
Hoje o carpete é usado em diferentes mercados e cenários antes impensáveis.
Valor: Em hospitais brasileiros o carpete é incomum. Como fica a questão da higiene e das bactérias?
Anderson: Muitos hospitais têm aderido aos carpetes para tornar o ambiente mais humanizado, com mais conforto e com cara de residência. Quanto à questão da higiene, desenvolvemos um carpete antimicrobiano.
Valor: Em que condições as questões ambientais entraram na agenda da Interface?
Anderson: Em 1994, quando a empresa atingiu os 21 anos de idade, decidimos trabalhar de
forma a beneficiar o meio ambiente.
Esta decisão nasceu e cresceu embasada em um forte espírito de inovação. Parecia impossível trabalharmos de forma verde, mas decidimos fazer. Passamos a modificar processos e projetos para reduzir a emissão de gás e o consumo de energia.
Valor: O que foi feito para transformar a Interface em uma empresa verde?
Anderson: Começamos a eliminar uma série de desperdícios, a reduzir a emissão de gases e a aumentar o uso de materiais de fontes renováveis. Com uma série de ações conseguimos economizar US$ 336milhões desde 1995, reduzir o consumo de combustível fóssil em 45%, a produzir 60% a menos de gases que causam o efeito estufa e a reduzir em um terço o uso da água. Isso tudo, veja bem, em um cenário com um aumento de 49% nas vendas. Boa parte das economias obtidas com nossas ações foi reinvestida em pesquisa e desenvolvimento.
Graças ao redesenho de processos e produtos e ao trabalho de mudança da mentalidade dos funcionários, hoje muito comprometidos com nossos objetivos ambientais. Isso tudo nos ajudou a obter economia, a fazer o bem e a criar uma boa imagem.
Valor: Quando a Interface deve atingir a sustentabilidade?
Anderson: Nossa meta é atingila em 2020, em todas as dimensões da companhia — pessoal,
processos, produtos, lucratividade e questões ambientais. Em 1994 iniciamos a busca por alternativas
para trabalhar apenas com fontes e matérias-primas renováveis
e temos apostado muito na reciclagem do carpete. Antigamente
só conseguíamos reciclar uma parte do carpete. Agora, depois de investirmos em muitos
estudos, conseguimos reciclar o carpete inteiro, a partir do desmanche da peça até chegar às suas origens. Com isso, economizamos
energia, recursos naturais e diminuímos resíduos de produção.
Cerca de 20% do total de material que usamos hoje na produção do carpete são reciclados.
Nossa idéia é chegar a 2020 com 100% da matéria-prima do
carpete advindas de material reciclado ou de fontes renováveis.
Também queremos chegar a 2020 com zero em emissão de gases e uso de água.
Valor: Como anda o desempenho da oferta de aluguel de carpetes?
Anderson: Do ponto de vista ambiental é excelente. Retiramos o carpete usado e o reciclamos. O aluguel é bom para o produtor do carpete, para o planeta e também para o cliente, que paga por mês uma parcela baixa e pode escolher textura, cor, acústica, eletricidade, entre outros detalhes. O problema é que poucas empresas aderiram a esta modalidade. O maior usuário do aluguel de carpetes hojeéogoverno americano.